terça-feira, 1 de julho de 2025

A vida




Camilo Martins Neto



Mergulho no rio 


Correnteza à baixo


Nadando de frente


Ora de lado


Outras de costas


Enfrentando tudo


Basculhos, pedras


Cortantes folhas,


Águas turvas,


Peixes vorazes,


Cobras venenosas,


Peçonhentos tantos


A desanimar a lida.


Mas, nado, e, nada


Me impede a ida


Quero chegar ao


Outro lado da vida.


Canso, descanso


E no remanso fico


A boiar na água


Mansa do meu rio.


Rio que vai e nunca


Mais volta, tal como


Eu que nado, nado...


E vou, pra nunca


Mais voltar à mesma


Água que se foi.


É assim, braços


Cansados, pernas


Cansadas, corpo


Cansado, o tempo


Que também se foi...


Estou quase chegando


Ao outro lado do rio


Nado e nada me


Impede de pisar


Em solo firme


E vem lembranças


Da travessia 


Quanta luta e o


Suor se misturando


Com a água do rio,


As lágrimas a


Aumentarem-lhe


O volume e juntar-se


À água salgada


Do velho mar.


Falta pouco e


Nesse pouco


Vejo o quanto


Foi importante


Nadar e não


Deixar que nada


Impedissem as


Sagradas braçadas


Que além das


Forças, minhas e


Do rio, foram


Vencendo cada


Obstáculo quase


Intransponíveis


Da travessia do rio.


E continuo nadando


E dando tudo de


Mim para vencer


A correnteza final


E chegar e sorrir


E chorar de alegria


E descansar afinal


Merecidamente


Eternamente, pois


Assim é a vida. 

segunda-feira, 30 de junho de 2025

Fato Consumado


 





 Rodolfo Pamplona Filho




Não posso

me deixar consumir

pelo fato consumado

Não posso

chorar compulsivamente

pelo leite derramado

Não posso

fazer voltar

as águas do rio

Não posso

tirar a roupa 

e reclamar do frio

 


Salvador, 18 de julho de 2024.

domingo, 29 de junho de 2025

Os Pastos da Razão

 

 




Chico Settineri




       Deboche delírio fêmea...


       Piratas especialistas


       de naus


        do Descobrimento.


       Diâmicos, cruéis, polivalentes


       cruzamos juntos, tontos e doentes


       os passos (tentem!)


       da paixão.

sábado, 28 de junho de 2025

Feminismo Negro

 





Rodolfo Pamplona Filho


 


No coração da luta, onde a voz ressoa,

celebra-se a visibilidade da pessoa,

que não pode mais ficar calada,

nem muito menos ser silenciada.


 


Das sombras do passado, ergue-se altivo

um movimento imparável e decisivo.

Contra a opressão, levanta-se em união,

celebrando a força, a coragem e a visão.


 

Mulheres negras, guerreiras de luz,

quebram as correntes, desafiam a cruz.

Nas ruas, palcos e páginas da história,

O feminismo negro escreve sua trajetória,

reivindicando espaço, justiça e igualdade,

empoderando vidas, com amor e dignidade.

 


É a voz que ecoa, em cada canto e esquina,

A luta pelo direito de ser quem se destina.

Feminismo negro, raiz de resistência e poder,

estrela que ilumina o caminho a percorrer.


 


Salvador, 8 de junho de 2024.

sexta-feira, 27 de junho de 2025

Recado

 



Fagundes de Oliveira





Demonstra com doçura o teu amor,

Num gesto apenas, sem falar, só pensa

O quanto o sentimento é uma presença

Que adorna a vida e a encanta em seu valor.



O orvalho da manhã tem um sabor

De vida nova e uma esperança imensa.

O tempo vai passando e a recompensa\

É igual a um beijo dado com calor.



Procura ser feliz - a vida é leve

Não pára e não dá tempo à indecisão;

É um vento que acalenta enquanto é breve.



O sonho vai passando e na verdade

É uma janela aberta à imensidão

Com gosto de esperança e de saudade.

quinta-feira, 26 de junho de 2025

A Dor que (quase) me fez chorar

 


 




 Rodolfo Pamplona Filho




O gosto amargo da solidão

Do veneno, a ingestão

A tristeza da partida

O masoquismo da despedida

O começo da consciência

O fim da existência

Descobrindo finalmente

e realmente

a dor que (quase) me fez chorar

quando o que sempre

esteve para se concluir

finalmente se completa


 

Salvador, 20 de junho de 2024.

quarta-feira, 25 de junho de 2025

Um brilho tênue





Cristiane França



Um brilho tênue...

Sem desesperos...

Sem atropelos...

Somente se põe em mim.

Ressurge forte ao amanhecer

Porque ternamente se pôs

Permitindo o anoitecer.

Temores das sombras não

calam tão fortemente no

Espírito... Pois,

os olhos já conheceram o sol!


terça-feira, 24 de junho de 2025

Adoção Afetiva

 




Rodolfo Pamplona Filho




A vida me contemplou

com filhos maravilhosos,

tanto no sangue,

quanto no coração!



Isso se dá, com fé,

pois, definitivamente,

a paternidade não é

uma biologia permanente.


É muito mais do que isso:

é uma eleição de paradigma

de quem assume o compromisso

de não ser um enigma.


Apadrinha-se, torna-se companheiro,

confidente, ombro amigo e parceiro.

Comemora-se junto, chora-se também,

da verdade biológica, vai-se além...


A paternidade por adoção afetiva

honrou-me com um carinho

que nem todos têm na vida...

que não se compreende sozinho...


mas que é a prova mais dura

de que pessoas podem se amar

e se entregar de forma pura,

sem qualquer outro interessar,


como deveria ser, aliás,

em qualquer verdadeira relação

de um afeto que não volta atrás...

de uma escolha consciente de devoção.

segunda-feira, 23 de junho de 2025

Exílio e Miopia (para Julia)

 



Claudia Moraes Rego




       "Olha o balão!"

       Não via.

       Não falava nada.



       "Olha o gavião!"

       Não via.

       Calava.



       "Olha o Cristo Redentor!"

       Puxa, não via!

       Mas fingia


       "O bondinho!"

       Nada.

       Era assim.


       Certamente,

       sem dúvida nenhuma,

       fazia parte

       (tinha caído do lado)

       da tribo dos exilados

       do prazer.


domingo, 22 de junho de 2025

Síndrome de Madre Superiora

 




Rodolfo Pamplona Filho




Comandar os passos,

mesmo quando ninguém

pediu por isso

Portar-se como censor,

estabelecendo volume

e assunto que possa ser tratado

Irar-se e fechar-se

quando alguém faz algo

fora do script

Desconhecer que 

o Líder de verdade

tem sua autoridade

na sua credibilidade,

e não na sua vontade.



São Paulo, 16 de novembro de 2019.

sábado, 21 de junho de 2025

Esquiva





Garcia Rosa



     Quando passas altiva e desdenhosa,

     Como uma deusa em mármore esculpida,

     Lembras-me a Grécia antiga e luminosa

     E, adorando a Mulher, bendigo a Vida.




     Toda a força do amor misteriosa

     Trazes soberbamente refletida

     Na perfeição da plástica mimosa

     E na graça do andar, indefinida...




     Mas quando te acompanho na esperança

     De penetrar os íntimos refolhos

     Dessa alma em flor, que a amar não se abalança,




     Volves em torno, distraída, os olhos,

     Na pertinácia vã de uma esquivança

     Que semeia ilusões em vez de abrolhos.

sexta-feira, 20 de junho de 2025

Medicina

 

 




Rodolfo Pamplona Filho



É no Santuário de Sculapio,

em que Hipócrates separou

o Logos da Cega Crença,

que se depositam as esperanças

de quem ainda crê em salvação,

não da alma perdida ou maltratada,

mas, sim, do corpo massacrado,

entregue às intempéries da saudade,

no sofrimento da enfermidade.

Não se sabe quem cura:

se Deus ou a mão do homem...

Isto pouco importa para quem busca

a retomada do vigor,

o reencontro do calor

e a superação do torpor

do sofrimento e da dor.




Atenas/Grécia, 29 de setembro de 2012, pensando no Templo de Sculapio.

quinta-feira, 19 de junho de 2025

Formosa

 

 





Maciel Monteiro






     Formosa, qual pincel em tela fina


     Debuxar jamais pode ou nunca ousara;


     Formosa, qual jamais desabrochara


     Na primavera a rosa purpurina;




     Formosa, qual se a própria mão divina


     Lhe alinhara o contorno e a forma rara;


     Formosa, qual jamais no céu brilhara


     Astro gentil, estrela peregrina;




     Formosa, qual se a natureza e a arte,


     Dando as mãos em seus dons, em seus lavores


     jamais soube imitar no todo ou parte;




     Mulher celeste, oh! anjo de primores!


     Quem pode ver-te, sem querer amar-te?


     Quem pode amar-te, sem morrer de amores?!

quarta-feira, 18 de junho de 2025

Soneto da Dissonância Cognitiva






Rodolfo Pamplona Filho


Contrastar uma crença básica

em oposição diametral à outra.

Viver uma vida antropofágica,

devorando o que está à solta.


Declarar-se algo

que se sabe que não se é...

pois tudo que conquistou

foi baseado em um temor


que deixou de existir,

passando a viver

somente para repetir


o que nem mais se crê,

em  uma forma de auto-punir,

ao impor a si mesmo um sofrer...




Mikonos, 24 de setembro de 2012.

terça-feira, 17 de junho de 2025

 






Chico Buarque de Holanda

       


O meu pai era paulista

Meu avô, pernambucano

O meu bisavô, mineiro

Meu tataravô, baiano

Meu maestro soberano

Foi Antonio Brasileiro

Foi Antonio Brasileiro

Quem soprou esta toada

Que cobri de redondilhas

Pra seguir minha jornada

E com a vista enevoada

Ver o inferno e maravilhas


Nessas tortuosas trilhas

A viola me redime

Creia, ilustre cavalheiro

Contra fel, moléstia, crime

Use Dorival Caymmi

Vá de Jackson do Pandeiro


Vi cidades, vi dinheiro

Bandoleiros, vi hospícios

Moças feito passarinho

Avoando de edifícios

Fume Ari, cheire Vinícius

Beba Nelson Cavaquinho


Para um coração mesquinho

Contra a solidão agreste

Luiz Gonzaga é tiro certo

Pixinguinha é inconteste

Tome Noel, Cartola, Orestes

Caetano e João Gilberto


Viva Erasmo, Ben, Roberto

Gil e Hermeto, palmas para

Todos os instrumentistas

Salve Edu, Bituca, Nara

Gal, Bethania, Rita, Clara

Evoé, jovens a vista


O meu pai era paulista

Meu avô pernambucano

O meu bisavô, mineiro

Meu tataravô baiano

Vou na estrada há muitos anos

Sou um artista brasileiro

segunda-feira, 16 de junho de 2025

Necessidade de Reclamar

 

 




Rodolfo Pamplona Filho



Há indivíduos que

mal comem feijão com arroz

e querem questionar

a qualidade do champagne...

Pessoas que não sabem distinguir

um idioma de um dialeto,

um prato de um lanche

ou uma casa de um lar

e querem posar para a sociedade

como sacerdotes do culto,

vestais do templo

ou oráculos da verdade...

Pobres diabos,

eles não sabem

o que fazem, pois

sua vontade de viver

se confunde com

sua necessidade de reclamar...




Pamplona/Espanha, 03 de outubro de 2012.


domingo, 15 de junho de 2025

A Vida

 


 



Adão José Pereira



     A vida é um poema mui lindo


     Que o Pai Celeste assinou,


     E com habilidade infinda


     Afeto e ternura expressou.




     Porém ela é veloz e passageira,


     Corre tão rapidamente!


     E qual uma águia ligeira,


     Passa e nos leva de repente.




     Ma enquanto existe há esperança


     De que melhores dias virão!


     Trazendo paz, amor e bonança,


     Fartura, prosperidade e realização.

sábado, 14 de junho de 2025

Soneto da Sintonia Infalível









Rodolfo Pamplona Filho




Ainda que divididos pelo Atlântico


e por fusos horários incompatíveis,


o que um sente de um lado,


o outro automaticamente responde.




Se um levanta assustado,


encontrará o outro conectado,


como se a energia gerada


fosse automaticamente repassada.




É realmente impressionante,


como tudo surge em um instante,


permitindo a imediata compreensão




pois o que, para muitos, é acaso,


para mim, é o mais evidente traço


de uma sintonia infalível de paixão.




Pamplona/Espanha, 03 de outubro de 2012.

sexta-feira, 13 de junho de 2025

Dia

 


 

Adélia Prado


As galinhas com susto abrem o bico

e param daquele jeito imóvel

- ia dizer imoral -

as barbelas e as cristas envermelhadas,

só as artérias palpitando no pescoço.

Uma mulher espantada com sexo:

mas gostando muito.

quinta-feira, 12 de junho de 2025

Todo mundo é vítima

 




Rodolfo Pamplona Filho



Todo mundo é vítima

e ninguém assume a culpa

Todo mundo é vítima

e se pode fugir da luta

Todo mundo é vítima

e se empurra a responsabilidade

Todo mundo é vítima

e não se muda nada de verdade

Todo mundo é vítima

e há argumento para tudo

Todo mundo é vítima

e punir é um absurdo

Todo mundo é vítima




No Trem de Madrid para Pamplona, 02 de outubro de 2012.