sábado, 1 de outubro de 2016

Soneto da Fidelidade


Vinícius de Moraes

De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

sexta-feira, 30 de setembro de 2016

Cara de pau



                                                                                                           Rodolfo Pamplona Filho

O indivíduo fura a fila
e ainda reclama da bagunça;
reclama da falta de ética
e pede um cargo no serviço público;
protesta contra a corrupção
e trabalha sem nota fiscal;
fala que o serviço é ruim
e sai mais cedo da aula;
diz que ninguém presta
e esquece que faz parte do todo;
sonha com um mundo diferente
e faz tudo igual...
No final, esse tipo de gente
não passa de um cara de pau...

Salvador, 10 de agosto de 2016, assistindo a ida para a Fonte Nova...

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Rápido e rasteiro


Chacal

vai ter uma festa
que eu vou dançar
até o sapato pedir pra parar.
aí eu paro, tiro o sapato
e danço o resto da vida

quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Liberdade


Rodolfo Pamplona Filho

Liberdade é
uma palavra
para dizer
que não há mais nada
a perder...

Salvador, 11 de agosto de 2012.

terça-feira, 27 de setembro de 2016

Cogito



Torquato neto

eu sou como eu sou
pronome
pessoal intransferível
do homem que iniciei
na medida do impossível
eu sou como eu sou
agora
sem grandes segredos dantes
sem novos secretos dentes
nesta hora

eu sou como eu sou
presente
desferrolhado indecente
feito um pedaço de mim
eu sou como eu sou
vidente
e vivo tranquilamente
todas as horas do fim

segunda-feira, 26 de setembro de 2016

O Segredo da Serenidade



É preciso saber
que o sofrimento
não é sua exclusividade.

É preciso conhecer
e vivenciar
o segredo da serenidade.

É preciso respirar
em vez de chorar
e se desesperar.

É preciso parar
e olhar o horizonte
para compreender o que ocorreu.

É preciso não esperar
o mar se abrir (embora ele possa...)
e aprender a nadar...

É preciso transformar
o mistério em problema
para poder solucioná-lo.

Boston, 25 de junho de 2016.

domingo, 25 de setembro de 2016

O Teu Riso



Pablo Neruda

Tira-me o pão, se quiseres,
tira-me o ar, mas
não me tires o teu riso.

Não me tires a rosa,
a flor de espiga que desfias,
a água que de súbito
jorra na tua alegria,
a repentina onda
de prata que em ti nasce.

A minha luta é dura e regresso
por vezes com os olhos
cansados de terem visto
a terra que não muda,
mas quando o teu riso entra
sobe ao céu à minha procura
e abre-me todas
as portas da vida.

Meu amor, na hora
mais obscura desfia
o teu riso, e se de súbito
vires que o meu sangue mancha
as pedras da rua,
ri, porque o teu riso será para as minhas mãos
como uma espada fresca.

Perto do mar no outono,
o teu riso deve erguer
a sua cascata de espuma,
e na primavera, amor,
quero o teu riso como
a flor que eu esperava,
a flor azul, a rosa
da minha pátria sonora.

Ri-te da noite,
do dia, da lua,
ri-te das ruas
curvas da ilha,
ri-te deste rapaz
desajeitado que te ama,
mas quando abro
os olhos e os fecho,
quando os meus passos se forem,
quando os meus passos voltarem,
nega-me o pão, o ar,
a luz, a primavera,
mas o teu riso nunca
porque sem ele morreria.