sábado, 16 de novembro de 2019

Biografia Sintática




Alberto da Cruz






Eu, substantivo, na ação verbal
Como objeto jamais quis permanecer.
Nutri em vida o ledo sonho
De como sujeito me enternecer.


Fui infeliz na sintaxe da vida,
Pois primeiro me coube a função
Completiva de outro nome
Por imposição de um Ser.


Tornei-me passivo e subordinado,
Com deveras esforço, galguei novo cargo.
Como adjunto caracterizei um cognato
Desses mais aclamados.


Tempos passados me coordenaram
E por meros instantes me orgulhei,
Mas quis o sádico destino alomorfizado
Que eu fosse somente um derivado.


No processo verbal, deixaram-me,
Sem me consultar, no predicado.
Tolo eu fui, pois não me permitiram nuclear...
Completei, assim, um indiferente verbo irregular.


Sofri a farfalhada zombaria
De ingratas preposições....
Delas nada mais se pode esperar,
E a pena caridosa das interjeições
Suspirando seus ai, ais!


Ao meu lugar me pus
E aceitei a passividade do termo,
Quando me promoveram à categoria
De objeto direto, mas por não confiarem,
Fui impiedosamente pleonastiquizado .


A pena, cumpri sem questionar,
Pois esperanças mantive de me verbalizar;
E na diferente construção,
Enfim me realizar.


Não tive a sorte
E no período vaguei
Sem fixa posição,
Totalmente sem lugar.


Quando por fim a notícia tive,
Estava a me deslocar.
Convidaram-me para sujeito
E nem pude acreditar.


De gala me vesti
Todo, inteiro e aprumado
Com o sorriso exposto compareci
Para ser apenas indeterminado.


Magoado com os termos
Faltando a concordância
Brigado com a regência
Desisti da sintaxe...


E fui ser anacoluto na vida.

sexta-feira, 15 de novembro de 2019

Reencontro








Rodolfo Pamplona Filho

Hoje à noite...
mantive meu olhos fixos nas possibilidades dos meus sentimentos
descobri entre conversas poucas que o amor é amplo e que tudo acalenta
me sinto abraçada através dos pensamentos
e neste momento nada mudaria...

Hoje à noite...
não tenho mais dúvidas
que os caminhos escolhidos mudam como o vento
e que através de soluços e risos
o destino nos presenteia.

Hoje à noite...
vou calar e ficar quieta
esperando que um novo dia comece
para que nosso cuidado volte a nos preencher.

Hoje à noite...
Procuro uma resposta para perguntas que não consigo formular
Penso em tudo que vivi e como tudo poderia ter sido
Quero acreditar que o caminho foi o correto
e neste momento nada mudaria...

Hoje à noite...
não tenho mais dúvidas
de que é possível um novo caminho
paralelo ao já traçado que
o destino nos presenteia.

Hoje à noite...
continuarei descansando em paz
na certeza de que vale a pena esperar
para que nosso cuidado volte a nos preencher.

O cuidado em suas palavras
me faz respirar com fadiga
e mostra quanto eu me vejo em você
me deixa segura

A estrada finalmente nos achou
por vezes tortuosa e depressiva
e que nos retirou o chão
quando mais precisávamos

Não penso no perigo
de ter-lhe perto
de que não é errado
ter uma vida pra você
e flutuar por sonhos impossíveis

O cuidado nas palavras sempre se deu,
pois necessário para não machucar
a planta que nasceu ou renasceu
sem ninguém sequer esperar...

A estrada que fez nossos nós
é a mesma estrada que sempre trilhamos
e que não tomou decisões por nós,
mas que, por ela, caminhamos...

Haverá sempre um perigo concreto
de pensar não estar sendo correto
mas não há certo ou errado
quando o impossível é tentado

Se será somente platônico, eu não sei...
Só sei que tem me feito bem...
talvez o destino seja somente emocional
e o encontro eventual ou ocasional...

Isso pouco importa, de fato,
pois o mais relevante retrato
apagou a minha inaptidão do passado
ou imaturidade no contato

Quem disse que o sonho é impossível?
O sonho é sempre real.
Se a realidade não nos é factível,
que o seja o amor espiritual...

FIM?
Início...

Salvador, 10 de setembro de 2010, dialogando sobre passado, presente e futuro...

quinta-feira, 14 de novembro de 2019

Vinho e cigarro



Alberto da Cruz






Minha ruína bebo em longos goles;
Minha morte sorvo lentamente;
Meu destino vejo calado...
A me fitar sofregamente.


Esta taça em minhas mãos,
Este ardor me corrói lentamente...
Rubros olhos, face rubra...
E o delírio em mim... intensamente.


Aproxima-se do fim o líquido rapidamente...
Desvirtuo a vida e nos prazeres
Insana a consciência dos quereres...
A fumaça toma a cela completamente.


A morte encerra a vida;
Na garrafa finda o vinho...
As cinzas acabam no cinzeiro...
O poema termina no lixo...



— E meu corpo na sepultura! —

quarta-feira, 13 de novembro de 2019

Imagine a cena...








Rodolfo Pamplona Filho

Imagine a cena...
Eu, sozinha,
banho tomado,
camisola de seda
e uma taça de vinho...

Estou feliz por estar só
pois, neste momento,
poderei dormir tranqüila,
imaginando você ao meu lado
e me fazendo acreditar
que o que sinto
é o amor mais puro
e perfeito que já tive...

Sinto sua falta
e queria muito mesmo
estar aí com você....
Na verdade,
essa vontade
nunca vai passar
pois descobri em você
minha extensão...
minha essência
e meu maior prazer..

Pensa em mim, amor!
Eu, de minha parte,
não tiro você da cabeça,
nem do coração...

Salvador, 30 de outubro de 2010.

terça-feira, 12 de novembro de 2019

Condenado!






Alberto da Cruz




Condenado!
Arqueado sobre a mesa
E ensimesmado.
Condenado!
Mutilado pela beleza
E derrotado.


Condenado!
Injustiçado por esperteza
E arruinado.
Condenado!
Acamado por tristeza
E sufocado.


Condenado!
Velado sem pureza
E amaldiçoado.
Condenado!
Sepultado sem nobreza
E abandonado.


Castelos


Castelos desmoronam
Com rapidez estonteante.
Construídos com maestria
Não contavam com a maresia
Nos terrenos arenosos.
As paredes se desfazem
O teto cai
O chão rui...


Nada mais existe,
Os sonhos morrem
Quando a onda vai.

segunda-feira, 11 de novembro de 2019

Para um amor secreto








Rodolfo Pamplona Filho

Querido
Você nem imagina como estou ligada em você...
Você nem imagina como estou ligada a você
Eu me emociono só de pensar
em como seria maravilhoso
ouvir nossas musicas com você...

Descobrir sua essência, além da casca,
fez despertar o amor e a ansiedade de estar perto.
Quero ficar com você em meu colo, vendo o por do sol até a lua iluminar sua face...
Quero fazer um cafuné, deslizando minha mão sobre seus cabelos, ate sentir sua pele...
Quero beijar seu rosto delicadamente, ate fazer você acreditar que não está sonhando...
Quero até mesmo brigar com você, só para ter o prazer da reconciliação...

Você tem um efeito perturbador em mim...
É um sentimento forte, que toma todo meu pensamento...
que me anestesia em alguns momentos
quando imagino nossas vontades reunidas...
E a única coisa que me faz melhorar é chorar...
mas é um choro de alívio e de esperança
de que, algum dia, poderemos
rir juntos e felizes...
...apenas por estar pertos um do outro.
...e você tentar me calar...
...e eu continuar falando que nem uma matraca...
...e você rir porque se diverte comigo...
...e porque não consigo disfarçar
meu nervosismo
de ter transformado
essa fantasia em realidade...

Você é parte de mim,
não como um agente externo,
mas como um complemento de mim mesmo.
Nosso amor não tem amarras, nem barreiras...
e é como um primeiro namoro...
no qual ficamos ávidos por um contato...
na palavra e no carinho...
Não consigo mais pensar na minha vida sem ter você.

Você está fora de todo tipo de definição.
Não posso dizer que é meu amigo,
nem amante, nem ficante,
nem pretendente, nem confidente...
não há rótulos....
Não somos nada disso e, dificilmente, alguém compreenderia esta relação.
Ela está fadada a permanecer apenas na publicidade de nossas almas e corações.

É como se você fosse eu...
como se meu pensamento estivesse em você.....
Por isso que me completa....
e ninguém me entende...
então ninguém entenderia você, dessa forma, na minha vida...

San Francisco, 25 de setembro de 2010.

domingo, 10 de novembro de 2019

Dia




Adélia Prado



As galinhas com susto abrem o bico
e param daquele jeito imóvel
- ia dizer imoral -
as barbelas e as cristas envermelhadas,
só as artérias palpitando no pescoço.
Uma mulher espantada com sexo:
mas gostando muito.