quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Ferida Narcísica



Rodolfo Pamplona Filho


Há quem eleja seus valores
como a pedra de toque do universo,
que não consegue respeitar
quem simplesmente
tenha outro prisma para olhar...

Há quem enalteça seu conhecimento
a um patamar tão elevado,
que qualquer questionamento
é encarado como uma ofensa
a ensejar total rompimento.

Há quem admire sua beleza
com tamanha intensidade,
que a imagem que não é espelho
não pode ser objeto de contemplação,
quanto mais de deslumbramento.

Há quem idolatre suas virtudes
de uma forma tão direcionada,
que a autoestima vira vaidade,
que o saber converte-se em arrogância
e a experiência, fanatismo.


Quarta-feira, 17 de agosto de 2016,  literalmente no voo para Vitoria/ES.





segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Construção



Chico Buarque



Amou daquela vez como se fosse a última

Beijou sua mulher como se fosse a última

E cada filho seu como se fosse o único

E atravessou a rua com seu passo tímido

Subiu a construção como se fosse máquina

Ergueu no patamar quatro paredes sólidas

Tijolo com tijolo num desenho mágico

Seus olhos embotados de cimento e lágrima

Sentou pra descansar como se fosse sábado

Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe

Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago

Dançou e gargalhou como se ouvisse música

E tropeçou no céu como se fosse um bêbado

E flutuou no ar como se fosse um pássaro

E se acabou no chão feito um pacote flácido

Agonizou no meio do passeio público

Morreu na contramão atrapalhando o tráfego

Amou daquela vez como se fosse o último

Beijou sua mulher como se fosse a única

E cada filho seu como se fosse o pródigo

E atravessou a rua com seu passo bêbado

Subiu a construção como se fosse sólido

Ergueu no patamar quatro paredes mágicas

Tijolo com tijolo num desenho lógico

Seus olhos embotados de cimento e tráfego

Sentou pra descansar como se fosse um príncipe

Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo

Bebeu e soluçou como se fosse máquina

Dançou e gargalhou como se fosse o próximo

E tropeçou no céu como se ouvisse música

E flutuou no ar como se fosse sábado

E se acabou no chão feito um pacote tímido

Agonizou no meio do passeio náufrago

Morreu na contramão atrapalhando o público

Amou daquela vez como se fosse máquina

Beijou sua mulher como se fosse lógico

Ergueu no patamar quatro paredes flácidas

Sentou pra descansar como se fosse um pássaro

E flutuou no ar como se fosse um príncipe

E se acabou no chão feito um pacote bêbado

Morreu na contra-mão atrapalhando o sábado

sexta-feira, 26 de agosto de 2016

Doação do seu eu



Rodolfo Pamplona Filho

É preciso aprender
a doar não somente
o que se tem,
mas, principalmente,
o que se é...
Dar de si
sem pensar em si...
Quem não vive para servir
não serve para viver...
Quem não entrega
seu próprio eu
não sabe o motivo
pelo qual viveu...

Salvador, 16 de janeiro de 2014, pensando...

quarta-feira, 24 de agosto de 2016

A esperança


Augusto dos Anjos



A Esperança não murcha, ela não cansa,
Também como ela não sucumbe a Crença.
Vão-se sonhos nas asas da Descrença,
Voltam sonhos nas asas da Esperança.

Muita gente infeliz assim não pensa;
No entanto o mundo é uma ilusão completa,
E não é a Esperança por sentença
Este laço que ao mundo nos manieta?

Mocidade, portanto, ergue o teu grito,
Sirva-te a crença de fanal bendito,
Salve-te a glória no futuro - avança!

E eu, que vivo atrelado ao desalento,
Também espero o fim do meu tormento,
Na voz da morte a me bradar: descansa!

terça-feira, 23 de agosto de 2016

Rompendo o Silêncio




Rodolfo Pamplona Filho

E dou-lhe uma!
É preciso resistir!
E saber que,
por mais que as nuvens
cubram o horizonte,
as estrelas continuam lá!

E dou-lhe duas!
É preciso repetir!
E mostrar que
um raio pode acertar
o mesmo alvo
seguidamente!

E dou-lhe três!
É preciso insistir!
E romper qualquer barreira
que os amantes do atraso
tenham tentado impor
como uma maldição.

E dou-lhe uma...
duas... três...
E que o triunfo inspire
para que o vencedor respire
e retome o caminho de glória,
em que se construiu a sua história.

No aeroporto de Guarulhos, 14 de setembro de 2014, para K9 e Maxi.

segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Não Pode Tirar-me as Esperanças




Luiz Vaz de Camões
Busque Amor novas artes, novo engenho, 
para matar me, e novas esquivanças; 
que não pode tirar me as esperanças, 
que mal me tirará o que eu não tenho.

Olhai de que esperanças me mantenho! 
Vede que perigosas seguranças! 
Que não temo contrastes nem mudanças,
andando em bravo mar, perdido o lenho.

Mas, conquanto não pode haver desgosto
onde esperança falta, lá me esconde 
Amor um mal, que mata e não se vê.

Que dias há que n'alma me tem posto 
um não sei quê, que nasce não sei onde, 
vem não sei como, e dói não sei porquê.

terça-feira, 2 de agosto de 2016

Saudade


Rodolfo Pamplona Filho

Parece doença...
Parece tristeza...
Parece dor no peito...
Parece desespero...
Parece depressão,
mas é só saudade...

Gramado, 18 de outubro de 2012