segunda-feira, 21 de abril de 2014

A ESPERANÇA DO MUNDO

A ESPERANÇA DO MUNDO
Bertold Brecht

Seria a opressão tão antiga quanto o musgo dos lagos?
Não se pode evitar o musgo dos lagos.
Seria tudo o que vejo natural, e estaria eu doente, ao desejar remover o
irremovível?
Li canções dos egípcios, dos homens que construíram as pirâmides.
Queixavam-se do seu fardo e perguntavam quando terminaria a opressão. Isto
há quatro mil anos.
A opressão é talvez como o musgo, inevitável.

Se uma criança surge diante de um carro, puxam-na para uma calçada. Não
o homem bom, a quem erguem monumentos, faz isso. Qualquer um retira
a criança da frente do carro.
Mas aqui muitos estão sob o carro, e muitos passam e nada fazem.
Seria porque são tantos os que sofrem? Não se deve mais ajudá-los, por
serem tantos? Ajudam-nos menos.
Também os bons passam, e continuam sendo tão bons como eram antes
de passarem.

Quanto mais numerosos os que sofrem, mais naturais parecem seus
sofrimentos, portanto. Quem deseja impedir que se molhem os peixes do
mar?
E os sofredores mesmos partilham dessa dureza contra si e deixam que
lhes falte bondade entre si.
É terrível que o homem se resigne tão facilmente com o existente, não só
com as dores alheias, mas também com as suas próprias.
Todos os que meditaram sobre o mau estado das coisas recusam-se a apelar
à compaixão de uns por outros. Mas a compaixão dos oprimidos pelos
oprimidos é indispensável.
Ela é a esperança do mundo.

( Poemas -1913-1956 Editora 34 -Seleção e tradução de Paulo César
deSouza - páginas 222-223))

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