domingo, 22 de maio de 2022

Olhos de um melro

 


 


Os olhos mecânicos do melro

eram as únicas coisas que se moviam

na sala. O quadro de Paul Klee desenhava

movimentos de um anjo,

eram movimentos eternos, insatisfatórios

porque não eram efêmeros resolúveis

numa fração de segundo. Os olhos porém

eram ágeis, falavam, escutavam, eram olhos

indagadores. Eu mesmo me imobilizei apavorado

perante aqueles movimentos rápidos e impacientes.


Sentei-me na cadeira de grande espaldar

defronte à escrivaninha. Dobrei a página,

deixando o marcador indicando-me a leitura

interrompida. Os olhos se detiveram,

por um instante. A seguir, desesperadamente

recomeçaram seus inteligentes movimentos.



 (Pantomimas e Animação, 1989)

 -J. B. Sayeg

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