sábado, 31 de outubro de 2015

Tem, mas acabou

Rodolfo Pamplona Filho





Ter, tem, mas acabou
Ter, tem, mas ainda não chegou
Ter, tem, mas ainda está com o fornecedor
Ter, tem, mas está em falta
Ter, tem,

São Paulo, 18 de setembro de 2015.

sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Ah destino!

Aíla Sampaio


enquanto te debulhas em marcar
o meu próximo passo,
um pássaro me oferta suas asas
e o sol arrefece seus raios
para me ver alçar vôo.

E quando penso que enfim driblei
a tua fúria, tu, agasalhado na
imponderável sina, não respeitas
o meu desejo de rasgar as distâncias.
Ris da minha pretensão de querer
arrebentar as amarras
e astuciosamente planejas a minha queda.

E tão bruscamente me fazes enxergar
que era de crepom o pássaro e inconsistentes
as asas, que esqueço de te condenar
e me censuro por sonhar tão alto.

quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Por que servir?

Rodolfo Pamplona Filho




Quem quer realmente servir
não deve tentar justificar
por causa do que faz ou foi feito,
mas pelo que essencialmente é!

Quando a verdade vira slogan,
perde-se o sentido da mensagem,
pois dedicação não é palavra vã
e, sim, entregar-se totalmente

não para ídolos reverenciar,
nem mostrar gratidão ou retribuição,
mas, de forma convincente,

buscar modelo e exemplo,
encontrando no próprio espelho
Santidade, Zelo e Fidelidade

Salvador, 20 de setembro de 2015.

quarta-feira, 28 de outubro de 2015

O utopista

Murilo Mendes




Ele acredita que o chão é duro
Que todos os homens estão presos
Que há limites para a poesia
Que não há sorrisos nas crianças
Nem amor nas mulheres
Que só de pão vive o homem
Que não há um outro mundo.

terça-feira, 27 de outubro de 2015

Vino et Veritas

Rodolfo Pamplona Filho






In vino, veritas
In veritas... Vino!
Life's too short
to drink bad wine...
A vida é muito curta
para tomar um vinho qualquer...


Stellenbosch, 12 de setembro de 2015.

segunda-feira, 26 de outubro de 2015

O inútil luar

Manuel Bandeira





É noite. A Lua, ardente e terna,
Verte na solidão sombria
A sua imensa, a sua eterna
Melancolia . . .
Dormem as sombras na alameda
Ao longo do ermo Piabanha.
E dele um ruído vem de seda
Que se amarfanha . . .


No largo, sob os jambolanos,
Procuro a sombra embalsamada.
(Noite, consolo dos humanos!
Sombra sagrada!)


Um velho senta-se ao meu lado.
Medita. Há no seu rosto uma ânsia . . .
Talvez se lembre aqui, coitado!
De sua infância.


Ei-lo que saca de um papel . . .
Dobra-o direito, ajusta as pontas,
E pensativo, a olhar o anel,
Faz umas contas . . .


Com outro moço que se cala,
Fala um de compleição raquítica.
Presto atenção ao que ele fala:
— É de política.


Adiante uma senhora magra,
Em ampla charpa que a modela,
Lembra uma estátua de Tanagra.
E, junto dela,


Outra a entretém, a conversar:
— "Mamãe não avisou se vinha.
Se ela vier, mando matar
Uma galinha."


E embalde a Lua, ardente e terna,
Verte na solidão sombria
A sua imensa, a sua eterna
Melancolia . . .


domingo, 25 de outubro de 2015

Sentir-se Fraude

Rodolfo Pamplona Filho



Às vezes, ás...
Às vezes, asno...
Saber que sabe mais
do que a média 
não é garantia 
de saber alguma coisa...
pois, por mais que se saiba,
todo conhecimento 
será sempre limitado,
enquanto não há 
limite para a ignorância...

Capetown, 08 de setembro de 2015.

sábado, 24 de outubro de 2015

Não tão simples assim

Trocarei de nome
No primeiro momento
Do nosso ultimo encontro
Pondo fim a mentira que acreditávamos
Unir as diferentes metades

Marcarei meu corpo e
Incendiarei as lembranças
Ainda que elas vagueiem nas notas
De uma canção que traga saudade
Em dado momento de solidão

- mas se o teu nome está definitivamente marcado na memória.
Então que seja perdoada a minha insanidade.
Pois ela é a única coisa que resta
A um homem refém de suas próprias lembranças
Alheias a realidade, porém escravas de um olhar.

Morrerei de fome!
(uma morte torpe),
e levarei às últimas instâncias.
Tudo aquilo que não acredito

Entre causas e consequências
O fim poderia ser os teus lábios
- mas não sei como acabará essa história.
(Não tão) simples assim.

Eduardo Lins e Luís Fellipe Pereira Siqueira

sexta-feira, 23 de outubro de 2015

quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Horas vivas

Machado de Assis

Noite: abrem-se as flores . . .
Que esplendores!
Cíntia sonha seus amores
Pelo céu.
Tênues as neblinas
Às campinas
Descem das colinas,
Como um véu.

Mãos em mãos travadas,
Animadas,
Vão aquelas fadas
Pelo ar;
Soltos os cabelos,
Em novelos,
Puros, louros, belos,
A voar.


— "Homem, nos teus dias
Que agonias,
Sonhos, utopias,
Ambições;
Vivas e fagueiras,
As primeiras,
Como as derradeiras
Ilusões!


— "Quantas, quantas vidas
Vão perdidas,
Pombas mal feridas
Pelo mal!
Anos após anos,
Tão insanos,
Vêm os desenganos
Afinal.


— "Dorme: se os pesares
Repousares,
Vês? — por estes ares
Vamos rir;
Mortas, não; festivas,
E lascivas,
Somos — horas vivas
De dormir. —"

quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Enarmonia

Rodolfo Pamplona Filho






Notas com nomes diferentes
para o mesmo som...
Dó sustenido e ré bemol
somente são a mesma nota
em um sistema temperado
que convenciona e uniformiza
para facilitar a compreensão...
E é preciso investir e acreditar
que realmente é possível
falar a mesma língua!
Quando a sintonia falta,
no diálogo que não se completa,
chama-se o feito à ordem
para reabrir os canais de comunicação...
Um, dois, três, testando...


Capetown, 10 de setembro de 2015.

quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Desculpas


Rodolfo Pamplona Filho




Por que é tão difícil dizer
que simplesmente errou
e que não cumpriu o dever?
Diga a alguém
que não está no horário
e ouvirá:




"O ônibus atrasou"
"A senha não funcionou"
"O sistema caiu"
"O pneu furou"
"Um parente morreu"
"Estava doente"
"Estão me perseguindo"
em vez do teoricamente esperado:
"Sim, você está certo.
Peço desculpas.
Assumo as consequências.
Esforçar-me-ei para não falhar novamente..."
Mas ninguém tem culpa...
Ninguém assume a culpa por nada...
Só há... Desculpas.


Capetown, 11 de setembro de 2015.

terça-feira, 13 de outubro de 2015

Envelhecer

Bastos tigre





Entra pela velhice com cuidado,
Pé ante pé, sem provocar rumores
Que despertem lembranças do passado,
Sonhos de glória, ilusões de amores.

Do que tiveres no pomar plantado,
Apanha os frutos e recolhe as flores
Mas lavra ainda e planta o teu eirado
Que outros virão colher quando te fores.

Não te seja a velhice enfermidade!
Alimenta no espírito a saúde!
Luta contra as tibiezas da vontade!

Que a neve caia! o teu ardor não mude!
Mantém-te jovem, pouco importa a idade!
Tem cada idade a sua juventude.

segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Sapiossexualidade

Rodolfo Pamplona Filho





Paixão não negada
Atração sexual 
Libido estimulada 
pela admiração intelectual 
Tesão incontrolável 
pela bagagem cultural
Vontade insaciável 
de aprendizado pessoal
Desejo filosófico 
pela visão de vida
de quem lhe inspira.
Descobrir eufórico 
que, em essência,
afrodisíaco é a Inteligência.


Capetown, 15 de setembro de 2015.

domingo, 11 de outubro de 2015

Os mortos

Ferreira Gullar





os mortos vêem o mundo
pelos olhos dos vivos

eventualmente ouvem,
com nossos ouvidos,
       certas sinfonias
                 algum bater de portas,
       ventanias

           Ausentes
           de corpo e alma
misturam o seu ao nosso riso
           se de fato
           quando vivos
           acharam a mesma graça
               

De Muitas Vozes (1999)


sábado, 10 de outubro de 2015

Possibilidades

Rodolfo Pamplona Filho






Não se aborreça com o que podia ter ocorrido.
Não se aborreça com o que pode acontecer.
Não se aborreça com o que não aconteceu.
Não se aborreça com nada.
Não se aborreça.


Stellenbosch, 12 de setembro de 2015.

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

Novas Poesias Inéditas


Alberto Caeiro





Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem acabei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem  alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,
Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.

Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que sogue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo :  "Fui  eu ?"
Deus sabe, porque o escreveu.

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Barnabé

Rodolfo Pamplona Filho





Poucas missões
são tão enriquecedoras
quanto servir
à comunidade!
Orientar,
esclarecer,
o caminho mostrar,
não deixar se perder...
Acreditar que
está a contribuir
para o bem da coletividade,
pois realmente assim está!
E nunca cair em tentação
da corrupção,
da falta de motivação,
da anestesia,
da letargia,
da reclamação por qualquer razão,
da desonra da mais nobre função:
Servir, não servir-se!


Capetown, 11 de setembro de 2015.

quarta-feira, 7 de outubro de 2015

Desejos vãos

Florbela Espanca





Eu queria ser o Mar de altivo porte
Que ri e canta, a vastidão imensa!
Eu queria ser a Pedra que não pensa,
A pedra do caminho, rude e forte!


Eu queria ser o sol, a luz intensa
O bem do que é humilde e não tem sorte!
Eu queria ser a árvore tosca e densa
Que ri do mundo vão e até da morte!


Mas o mar também chora de tristeza...
As árvores também, como quem reza,
Abrem, aos céus, os braços, como um crente!


E o sol altivo e forte, ao fim de um dia,
Tem lágrimas de sangue na agonia!
E as pedras... essas... pisá-as toda a gente!...
Florbela Espanca - Fanatismo


Minh’alma, de sonhar-te, anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver!
Não es sequer razão do meu viver,
Pois que tu es já toda a minha vida!


Não vejo nada assim enlouquecida...
Passo no mundo , meu Amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida!


"Tudo no mundo é frágil, tudo passa..."
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim!


E, olhos postos em ti, digo de rastros:
"Ah! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu es como Deus: Princípio e Fim!..."


terça-feira, 6 de outubro de 2015

Promessas

Rodolfo Pamplona Filho






Promessas não são certeza,
mas possibilidades...
Jurar pela saúde de alguém
é comprometer-se de forma séria,
muitas vezes publicamente,
mas não garante a conduta,
nem muito menos o resultado.
No acerto de contas,
todo pacta sunt servanda
é, potencialmente,
rebus sic stantibus...


Áquila Safari, 09 de setembro de 2015.

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

A cidade

Myriam Fraga





Foi plantada no mar
E entre corais se levanta.
O salitre é seu ar, 
Sua coroa, sua trança
de salsugem, 
Seu vestido de ametista, 
Seu manto de sal
E musgo.


Armada em firme silêncio
Dependura-se dos montes
E tão precário equilíbrio
Se propõe
Que além da porta ou portada, 
De janela ou de horizonte, 
O que a sustenta é o mistério, 
Triste chão, sombra vazia, 
Tempo escorrendo das pedras, 
Lacerado nas esquinas, 
Tempo — sudário e guia.




Mas que fera (ou animal)
Esta cidade antiga
Com sua densa pupila
Espreitando entre torres, 
Seu hálito de concha
A babujar segredos, 
Deitada entre os meus pés, 
Minha cadela e amiga.


Repete esta dureza
Este arfar entre dentes, 
Seu pulmão de basalto
Onde a morte respira.
E nas sombras da tarde
Em sangue no poente, 
Abre os olhos sem pálpebras
E dança. Em maresia
E estrelas afogada.


E nesta coreografia, 
Sopro de antigas paisagens
Um calendário se arrasta, 
Nas corroídas legendas
Apodrecidas fachadas
A mastigar as divisas
E outros símbolos manchados, 
Nos brasões onde goteja
O limo do esquecimento.


Não fosse a imaginada
Profecia, face e apelo
Das inscrições lapidares
Palimpsesto ou astrolábio
Na pedra, na cal, nos muros, 
Fendida casca de um mundo
Coagulado em memórias.


Restavam ossos e nomes, 
Desassistida batalha
Contra o tempo. E esta cidade, 
Com seu signo, seu quadrante
De cristal, 
Sua mensagem de calcário, 
Desfeita em vaga o soluço, 
Mergulharia no espaço
Pássaro alado, albergália.

domingo, 4 de outubro de 2015

Nenhum corpo é como o seu

Rodolfo Pamplona Filho





Nele, me espalho,
como a explorar
um território encantado
e inebriante...
Nele, me encaixo,
como se moldado
para uma sintonia exclusiva
e reconfortante...
Nele, procuro
cada forma de excitação,para sentir o arrepio
da troca de experiências.
Nele, coloco
minha língua,
meu desejo,
minha essência.
Nele, exercito
cada parte de meu ser,
esgotando cada líquido
e entregando o que sou...
Nele, descanso
sem medo do mundo lá fora,
pois o amanhã pertence
a quem descobriu o seu amor.



Capetown, 10 de setembro de 2015.

sábado, 3 de outubro de 2015

Eclipse oculto

Caetano Veloso
 


Nosso amor não deu certo
gargalhadas e lágrimas
de perto fomos quase nada
tipo de amor que não pode dar certo
na luz da manhã
e desperdiçamos os blues do Djavan.
Demasiadas palavras
fraco impulso de vida
travada a mente na ideologia
e o corpo não agia
como se o coração tivesse antes que optar
entre o inseto e o inseticida.
Não me queixo
eu não soube te amar
mas não deixo
de querer conquistar
uma coisa qualquer em você.
O que será?
Como nunca se mostra
o outro lado da lua
eu desejo viajar
no outro lado da sua
meu coração galinha de leão
não quer mais amarrar frustração
o eclipse oculto na luz do verão.
Mas bem que nós fomos muito felizes
só durante o prelúdio
gargalhadas e lágrimas
até irmos pro estúdio
mas na hora da cama
nada pintou direito
é minha cara falar
não sou proveito
sou pura fama.
Não me queixo
eu não soube te amar
mas não deixo
de querer conquistar
uma coisa qualquer em você.
O que será?
Nada tem que dar certo
nosso amor é bonito
só não disse ao que veio
atrasado e aflito
e paramos no meio
sem saber os desejos
aonde é que iam dar
e aquele projeto
ainda estará no ar?
Não quero que você fique fera comigo
quero ser seu amor
quero ser seu amigo
quero que tudo saia
como o som de Tim Maia
sem grilos de mim
sem preconceito, sem tédio, sem fim.

sexta-feira, 2 de outubro de 2015

Enantiodromia


Rodolfo Pamplona Filho











Admitir a atração 
pelo outro lado
de si mesmo.
Conseguir a Integração 
dos seus próprios polos.
Conhecer-se inteiramente 
é um desafio 
que poucos enfrentam...
É a busca do que 
não se viveu
para completar 
o que se é...

Capetown, 11 de setembro de 2015.

quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Vim ao mundo

Hermes de Lima




Vim ao mundo ,

Sigo na vida,

Nela vou

Até aonde der.

Enfrento tropeços

Sorrio com os êxitos,

Assim faço minha ida

Por aí afora,

Por vezes meus olhos

Entristecem e choram

Com as decepções

Que me surpreendem,

Outras vezes busco

Em meu caminho

 O encanto

E na frente, são risos,

Vejo alegria

O prazer nascido,

Brotante de mim.

Dessa forma

Vim ao mundo,

Sigo na vida...

 29/09/2015