segunda-feira, 28 de março de 2022

Cafarnaum

 

 



 



 



velhos armários,

guardando nas suas gavetas

o cheiro aveludado de tantos invernos,

esculpidos em retratos sonâmbulos,

carpidos no ranger de redes

e no murmúrio oblongo de potes de barro.

Nada há de velho que não enterneça.

nem o mofo,

nem o lodo,

nem os anos embotados no imaginário humano.

Nada passa que não nos faça avançar para antes,

para uma anterioridade lírica,

sob a luz das lamparinas

talhadas em ausências e muita solidão.

Nada há de novo que não nos mostre o velho,

o passado,

o que fomos nós,

nos passos tênues dos nossos avós,

no lastimoso grito memorial

dos nossos corpos na dança secular;

dos nossos corações empedernidos

pelas inúmeras cicatrizes

que clamam refeição.

O que há em nós

é um imenso desejo de reconstituição

de refazimento.

Um desejo

de saciar a nossa fome ancestral,

agora, no presente futuro.



Francisco Perna Filho

Para Jádson Barros Neves

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