sábado, 21 de maio de 2011

Quem deu asas ao tempo?

Quem deu asas ao tempo?

Rodolfo Pamplona Filho
O tempo não é pássaro para flutuar.
Apenas voar é mais rápido que correr...
Se o tempo voa, por que o arrastar
quando se está a sofrer?
Ou se espera uma resposta de alguém?
Ou se quer algo para nosso bem?

O tempo não é físico para tocar,
muito menos para andar ou voar...
Então por que o tempo é cruel,
muda a perspectiva do céu,
machuca com gosto amargo de fel
e nem sempre cumpre o seu papel?

Se o tempo e o espaço são ligados,
ambos estão no vácuo sem fim...
Se assim são, o tempo não é parado,
nem voa, como dizem por aí...
O tempo flutua...
como minha mente ao ver você nua...
como uma bailarina em um solo...
como minha cabeça no seu colo...

Quem deu asas ao tempo?
Não fui eu... Não sei, nem quero saber...
Mas todo tempo será pouco,
enquanto eu não tiver você... 

Na Conexão Praia do Forte-Salvador, 06 de fevereiro de 2011.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

PORTAIS DO DESESPERO

PORTAIS DO DESESPERO


No firmamento cálido de pedras
Polidas e talhadas com esmero,
Vaga nesses portais do desespero
O meu espectro pálido que redras,

Podando as alegrias que eu quero
Para avultar a sordidez que engendras
E ver brotar a podridão que medras,
Nessa parca existência que oblitero.

Vais consumindo pouco a pouco as graças
De outros espectros que rodeiam o caos
No espaço-tempo de guardar tuas caças.

Mas lá no fundo um acalento faço:
Que antes do alvor de um desses dias maus
Serei eu a sorrir do teu fracasso.



Alexandre Roque, 24 de janeiro de 2011

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Querer Ser

Querer Ser

Letra: Alexandre Machado e Rodolfo Pamplona Filho
Música: Alexandre Machado
Quando amanhecer, quero ser o sol...
Quando o céu escurecer, o luar...
Se o dia estiver triste, ser a chuva a molhar...
Ser quem você realmente amará...

Quando ficar tudo frio, quero ser o cobertor...
E, se, um dia, tiver chance, seu amor...
Quero ser a sua vida, quero ser esta canção...
Quero abrigo no seu coração

Quero subir pelas paredes...
Quero ser o que faltava...
Quero ser a cura
para a solidão que nos tomava

Quero ser seu desespero
Quero ser o seu alento
Quero roubar a cena
e eternizar este momento

De janeiro a janeiro, quero ser sua estação
e, num golpe, ocupar sua paixão...
Quero ser sua saída, sua fuga, seu prazer,
mas também que seja só eu e você

Dizem que me apaixonei
pela pessoa errada...
Queria muito - isso, eu sei! -
fosse uma só estrada...

Desejo queira ser
não mais de todos ou de ninguém,
alguém a me conhecer,
não mais tantos que vão e vêm...

Na conexão Salvador-Praia do Forte, 06 de fevereiro de 2011.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

FRAGMENTAÇÃO

FRAGMENTAÇÃO

por Ary Cyrne, sexta, 4 de fevereiro de 2011 às 10:38
Construi entre meus muros de contenção
Cidade de pedra e ilusão
Sem a claridade da emoção
Ou a lucidez do apaixonado
...
A areia de minha solidez
Resistiria à onda do mar
Meus olhos de um coração devez
Além do tempo quer se encontrar
...
Na mente dos que querem sonhar
Ainda bem que nem sei
Tudo que ousei a estudar
Tudo que tentei te passar
...
Mas quanto aprendi
Nas horas de tergiversar
Talvez seja sério sorrir
Talvez seja sério chorar
...
Nos muros onde criei
Os limites que não impingi
Aprisionaram-me na lei
Que não me permito fugir

ARY CYRNE
04/02/2011

terça-feira, 17 de maio de 2011

Viva João Ubaldo Ribeiro

Viva João Ubaldo Ribeiro

João Ubaldo Ribeiro completou, no dia 23 de janeiro de 2011, setenta anos. Nascido à Rua do Canal, nº 1, Ilha de Itaparica, Bahia, é um dos maiores romancistas de língua portuguesa do mundo.
De inteligência multifacetada, percorreu longo caminho até abraçar, de uma vez por todas, sua vocação de escritor. Em 1958, entrou na Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia. Após a formatura, em 1962, fez mestrado em Los Angeles, e, durante alguns anos, deu aulas de Ciência Política na UFBA e na Universidade Católica de Salvador. Largou a carreira acadêmica. Não chegou a exercer a advocacia. Seu destino não era o Direito. A Literatura lhe chamava. Aos 21 anos, escreveu seu primeiro romance (Setembro não tem sentido), que foi publicado, em 1968, com elogioso prefácio de Jorge Amado. 
Era preciso pagar as contas, vencer a guerra cotidiana pela sobrevivência. João Ubaldo exerceu, nas décadas de 60 e 70, a carreira de jornalista. Em 1975, chegou a assumir o cargo de editor-chefe da Tribuna da Bahia.
João Carlos Teixeira Gomes, no seu excelente ensaio crítico “João Ubaldo e a Saga do Seu Talento Triunfante” (RIBEIRO, João Ubaldo. Obra seleta. Organização Zilá Bernd. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2005), narra as dificuldades financeiras sofridas pelo escritor. Numa comovente carta enviada ao amigo Glauber Rocha, datada de 31 de outubro de 1979, João Ubaldo confessa a sua angustiante instabilidade econômica:
“Escrevo porque sinto falta dos amigos e me sinto um pouco desamparado. Decidi abandonar a condição de editor-chefe da Tribuna, embora ainda devo ficar fazendo uns negócios para eles. Não tenho a menor ideia do que vai acontecer, pois viver de escrever, mesmo no jornalismo, é phoda e, inclusive, ninguém me paga. A Folha paga, mas é pouco. Enfim, não sei. Talvez seja por isso que me deprima um pouco, talvez eu esteja chegando perto dos 40 e me ache um fodido – você veja. Eu não tenho nem onde morar (...)”.
Em outra carta enviada ao seu padrinho Glauber, datada de 28 de novembro de 1979, volta a se queixar da vida economicamente desarrumada:
“Ganho uma terrível miséria para escrever um editorial todo dia, várias notas, dois artigos de lauda e meia por semana, uma crônica de três laudas por semana e mais a edição de um tablóide mensal. Com isso, julguei estar conquistando algo, pois pelo menos trabalho em casa e de bermudas, mas me dá desgosto ter que escrever merdas.”
No início dos anos 80, Ubaldo deixou Salvador e voltou a morar na Ilha de Itaparica, na casa onde nasceu, “para cumprir o seu destino de escritor”, nas palavras de João Carlos Teixeira Gomes. Nos anos de 83/84, em Itaparica, escreveu a obra-prima Viva o Povo Brasileiro, monumental romance que percorre quatro séculos de história do país. João Carlos Teixeira Gomes relata que, “ao isolar-se com mulher e filhos na ilha, acreditando no seu poder criador e renunciando, ainda tão jovem, às solicitações e oportunidades das cidades grandes, foi lá que João Ubaldo acabou por escrever a saga do seu próprio talento, afinal triunfante”.
João Ubaldo decidiu viver exclusivamente de direitos autorais. Portanto, tem total autoridade para falar sobre o tema. Em recente artigo publicado no jornal A TARDE (edição de 26 de dezembro de 2010), intitulado “Viver corretamente”, com altivez, tece dura crítica aos que ainda pensam que escritores vivem vagabundeando por aí. Eis as suas preciosas palavras:
“Aliás, falando em livros, há outras novidades, ainda no terreno da cultura. O plano é mudar a lei dos direitos autorais. Os proponentes das mudanças dizem que não estão de fato querendo mudar nada, porque todas as suas ideias estariam contidas em dispositivos legais já existentes. Pergunta-se, nesse caso, por que é preciso fazer uma nova lei. Não sei bem, mas sei, pelo que já me foi contado, que a produção de cópias de livros ou textos será permitida, contanto que para fins educativos. Ou seja, qualquer coisa, ainda mais no mangue educacional que é o Brasil. O sujeito escreve um livro que é adotado em classe e esse livro pode ter praticamente uma edição à parte, pois há máquinas que possibilitam isso, copiando um livro inteiro e cuspindo do outro lado volumes já encadernados, com capa e tudo. O autor não vê um centavo, embora os produtores da edição pirata se remunerem pelo seu trabalho de ´difusão` e, principalmente, os fabricantes das máquinas ganhem.
Interessante isso. Acredita-se que um estudioso dedique anos de pesquisa e trabalho duro a produzir algo pelo qual não será pago, a não ser pela distinção de ser adotado nas escolas. Por que os funcionários do governo que lidam com cultura não abdicam de seus salários, já que a verdadeira cultura não pode ter preocupações materiais e o artista pode viver de brisa? Trabalhar para a cultura é isso, é ser filósofo e poeta aos olhos do grande público. Morrendo bêbado, tuberculoso e na sarjeta é ainda melhor, compõe o quadro romântico”.
Itaparica está em festa. A Bahia, orgulhosa e feliz. João Ubaldo é o prelúdio de um Brasil ainda imaginário, onde as pessoas amarão os livros, a criatividade e a possibilidade de abraçar sua própria vocação, seu próprio destino. Como disse Jorge Amado, no prefácio do primeiro romance ubaldiano: “Que alegria maior do que o encontro com um verdadeiro criador?”
A escolha literária de João Ubaldo resplandece nessa belíssima passagem de Viva o Povo Brasileiro, quando o general Patrício Macário, na festa de seu centenário, confessa um dos segredos da vida:
“– Vou lhe dizer uma coisa por enquanto inútil – cochichou. – Talvez para sempre, porque posso ser um velho caduco e não saber. Pssi! Você só vai poder ser tudo depois que for você! Pssi! Entendeu? Parece bobagem, mas não é! Temos de ser tudo, mas antes temos de ser nós, entendeu? Como é seu nome? Tudo, tudo, tudo, tudo! Pssi! Viva o povo brasileiro, viva nós!”
Viva João Ubaldo Ribeiro! Gigante das letras! 

Rodrigo Moraes é advogado autoralista. www.rodrigomoraes.com.br.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Empatados e Ferrados

Empatados e Ferrados

Rodolfo Pamplona Filho

Descobrir um novo sentido
para um caminho que parecia certo,
buscando conforto e abrigo
em quem passou a estar mais perto
do que, outrora, escondia do mundo,
enterrado na alma, bem lá no fundo.

Não se tem a menor estimativa
de tempo para ficar juntos.
Quer apenas a perspectiva
de, um dia, estar em sua companhia.

Não vê como fazer isso,
pois não deixa de amar seu arranjo,
mas quer um ao outro
como nunca quis outra pessoa...

Empatados, pois impedidos,
mas, também, de situação igual,
sem sair do zero a zero...
sem deixar de viver mal
sem fazer, publicamente,
o que o coração manda afinal...

Ferrados, pois amarrados,
agrilhoados, acorrentados,
sem real perspectiva
de uma outra saída...

Sempre na esperança
De que a vida se redirecione
como um sopro
e mude a qualquer instante

Empatados e Ferrados...
Mas absolutamente apaixonados...

Salvador, 01 de fevereiro de 2011.

domingo, 15 de maio de 2011

Drummond

Tem gente que tem cheiro de cafuné sem pressa, do brinquedo que a gente não largava, do acalanto que o silêncio canta, de passeio no jardim. Ao lado delas, a gente percebe que a sensualidade é um perfume que vem de dentro e que a atração que realmente nos move não passa só pelo corpo. Corre em outras veias. Pulsa em outro lugar. Ao lado delas, a gente lembra que no instante em que rimos Deus está conosco, juntinho, ao nosso lado. E a gente ri grande que nem menino arteiro. Tem gente como você, que nem percebe como tem a alma perfumada e que esse perfume é dom de Deus.

Carlos Drummond de Andrade