quarta-feira, 13 de julho de 2022

Poesia e vida

 



A lua projetava o seu perfil azul

Sobre os velhos arabescos das flores calmas

A pequena varanda era como o ninho futuro

E as ramadas escorriam gotas que não havia.

Na rua ignorada anjos brincavam de roda…

- Ninguém sabia, mas nós estávamos ali.

Só os perfumes teciam a renda da tristeza

Porque as corolas eram alegres como frutos

E uma inocente pintura brotava do desenho das cores

Eu me pus a sonhar o poema da hora.

E, talvez ao olhar meu rosto exasperado

Pela ânsia de te ter tão vagamente amiga

Talvez ao pressentir na carne misteriosa

A germinação estranha do meu indizível apelo

Ouvi bruscamente a claridade do teu riso

Num gorjeio de gorgulhos de água enluarada.

E ele era tão belo, tão mais belo do que a noite

Tão mais doce que o mel dourado dos teus olhos

Que ao vê-lo trilar sobre os teus dentes como um címbalo

E se escorrer sobre os teus lábios como um suco

E marulhar entre os teus seios como uma onda

Eu chorei docemente na concha de minhas mãos vazias

De que me tivesses possuído antes do amor.



-Vinicius de Moraes

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