sexta-feira, 2 de março de 2012

Filhos a imagem e semelhança (Danilo Gaspar)

Filhos à imagem e semelhança
Danilo Gaspar

Seríamos prolixos se tentássemos ser breves
Seríamos injustos se breves fôssemos
Seríamos ingratos se não agradecêssemos
Seríamos repetitivos se agradecêssemos tudo
Seríamos filhos-crianças se lembrássemos do passado
Seríamos filhos-adultos  se pensássemos no futuro
Seríamos felizes se fôssemos iguais a vocês
Seríamos amados se amássemos como vocês
Seríamos o que não somos se filhos seus não fôssemos
Mas, para sermos o que somos, vocês precisavam ser o que são!

quinta-feira, 1 de março de 2012

Magistrado da cidade de Marília (SP), que negou os benefícios da Justiça Gratuita a um menor, filho de um marceneiro



Magistrado da cidade de Marília (SP), que negou os benefícios
 da Justiça Gratuita a um menor, filho de um marceneiro


                           Decisão do Desembargador José Luiz Palma Bisson, do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferida num        Recurso de Agravo de Instrumento ajuizado contra despacho de um Magistrado da cidade de Marília (SP), que negou os benefícios       da Justiça Gratuita a um menor, filho de um marceneiro que morreu depois de ser atropelado por uma motocicleta. O menor         falecimento do pai.
         Por não ter condições financeiras para pagar custas do processo o menor pediu a gratuidade prevista na Lei 1060/50. O Juiz, no       entanto, negou-lhe o direito dizendo não ter apresentado prova de pobreza e, também, por estar representado no processo por    "advogado particular".
A decisão proferida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo a partir do voto do Desembargador Palma Bisson    é daquelas que merecem ser comentadas, guardadas e relidas diariamente por todos os que militam no Judiciário.


                                                                       A íntegra do voto:


"É o relatório.
        Que sorte a sua, menino, depois do azar de perder o pai e ter sido vitimado por um filho de coração duro - ou sem ele -, com o indeferimento da gratuidade que você perseguia. Um dedo de sorte apenas, é verdade, mas de sorte rara, que a loteria do distribuidor, perversa por natureza, não costuma proporcionar.
Fez caber a mim, com efeito, filho de marceneiro como você, a missão de reavaliar a sua fortuna.
        Aquela para mim maior, aliás,  pelo  meu  pai  -  por  Deus  ainda  vivente e trabalhador - legada, olha-me agora. É uma plaina manual feita por ele em paubrasil, e que, aparentemente enfeitando o meu gabinete de trabalho, a rigor diuturnamente avisa quem sou, de onde vim e com que cuidado extremo, cuidado de artesão marceneiro, devo tratar as pessoas que me vêm a julgamento disfarçados de autos processuais, tantos são os que nestes vêem apenas papel repetido. É uma plaina que faz lembrar, sobretudo, meus caros dias de menino, em que trabalhei com meu pai e tantos outros marceneiros como ele, derretendo cola coqueiro - que nem existe mais - num velho fogão a gravetos que nunca faltavam na oficina de marcenaria em que cresci; fogão cheiroso da queima da madeira e do pão com manteiga, ali tostado no paralelo da faina menina.        Desde esses dias, que você menino desafortunadamente não terá, eu hauri a certeza de que os marceneiros não são ricos não, de dinheiro ao menos. São os marceneiros nesta Terra até hoje, menino saiba, como aquele José, pai do menino Deus, que até o julgador singular deveria saber quem é.
O seu pai, menino, desses marceneiros era. Foi atropelado na volta a pé do trabalho, o que, nesses dias em que qualquer um é motorizado, já é sinal de pobreza bastante. E se tornava para descansar em casa posta no Conjunto Habitacional Monte Castelo, no castelo somente em nome habitava, sinal de pobreza exuberante.
        Claro como a luz, igualmente, é o fato de que você, menino, no pedir pensão de apenas um salário mínimo, pede não mais que para comer. Logo, para quem quer e consegue ver nas aplainadas entrelinhas da sua vida, o que você nela tem de sobra, menino, é a fome não saciada dos pobres.
Por conseguinte um deles é, e não deixa de sê-lo, saiba mais uma vez, nem por estar contando com defensor particular. O ser filho de marceneiro me ensinou inclusive a não ver nesse detalhe um sinal de riqueza do cliente; antes e ao revés a nele divisar um gesto de pureza do causídico. Tantas, deveras, foram as causas pobres que patrocinei quando advogava, em troca quase sempre de nada, ou, em certa feita, como me lembro com a boca cheia d'água, de um prato de alvas balas de coco, verba honorária em riqueza jamais superada pelo lúdico e inesquecível prazer que me proporcionou.
        Ademais, onde está escrito que pobre que se preza deve procurar somente os advogados dos pobres para defendê-lo? Quiçá no livro grosso dos preconceitos...
Enfim, menino, tudo isso é para dizer que você merece sim a gratuidade, em razão da pobreza que, no seu caso, grita a plenos pulmões para quem quer e consegue ouvir.
        Fica este seu agravo de instrumento então provido; mantida fica, agora com ares de definitiva, a antecipação da tutela recursal.
        É como marceneiro que voto.

JOSÉ LUIZ PALMA BISSON -- Relator Sorteado"

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Complexo

Complexo

Rodolfo Pamplona Filho

É difícil lidar
com quem vive
um complexo,
que supera seu ego
e absorve toda sua atenção.
O complexo é
uma memória afetiva
que, como um imã,
atrai todos os sentimentos
que possuam a mesma matriz.
Aí, tudo vem à tona,
como se voltasse a viver
tudo aquilo que fez sofrer,
pois, no inconsciente,
 o tempo não passa,
vivendo-se o eterno presente...
Todo mundo tem complexos
e isto, por si só,
não é algo ruim...
O perigo é ter só um
ou alguns poucos e fortes,
que, quando explodem,
tomam o indivíduo
de forma tão arrebatadora,
que não espaço
para qualquer outro papo,
já que não se admite dialogo,
virando conversa de surdos,
sem linguagem de libras,
pois o complexado
é monotemático,
obcecado e compulsivo.
Por isso, cuidado
quando um fato
trouxer à lembrança
uma imagem que ficou de herança,
pois pode ser um sinal
de que algo vai mal
em sua saúde mental...
O bom é ter, para ser honesto,
uma coleção de complexos,
que anulem reciprocamente
toda a energia latente...
Talvez assim
seja possível, enfim,
sobreviver finalmente
às armadilhas da própria mente.

Salvador, 29 de julho de 2011.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

DESPACHO INUSITADO DE UM JUIZ EM UMA SENTENÇA JUDICIAL ENVOLVENDO 2 POBRES COITADOS QUE FURTARAM 2 MELANCIAS.



DESPACHO INUSITADO DE UM JUIZ EM UMA SENTENÇA JUDICIAL ENVOLVENDO 2 POBRES COITADOS QUE FURTARAM 2 MELANCIAS. 

 
DESPACHO POUCO COMUM

                   A Escola Nacional de Magistratura incluiu em seu banco de sentenças, o despacho pouco comum do juiz Rafael Gonçalves de Paula, da 3ª Vara Criminal da Comarca de Palmas, em Tocantins. A entidade considerou de bom senso a decisão de seu associado, mandando soltar Saul Rodrigues Rocha e Hagamenon Rodrigues Rocha, detidos sob acusação de furtarem duas melancias:

DESPACHO JUDICIAL.
DECISÃO PROFERIDA PELO JUIZ RAFAEL GONÇALVES DE PAULA
NOS AUTOS DO PROC Nº. 124/03 - 3ª Vara Criminal da Comarca de Palmas/TO:
       

                   DECISÃO
                   Trata-se de auto de prisão em flagrante de Saul Rodrigues Rocha e Hagamenon Rodrigues Rocha, que foram detidos em virtude do suposto furto de duas (2) melancias. Instado a se manifestar, o Sr. Promotor de Justiça opinou pela manutenção dos indiciados na prisão.
                   Para conceder a liberdade aos indiciados, eu poderia invocar inúmeros fundamentos: os ensinamentos de Jesus Cristo, Buda e Ghandi, o Direito Natural, o princípio da insignificância ou bagatela, o princípio da intervenção mínima, os princípios do chamado Direito alternativo, o furto famélico, a injustiça da prisão de um lavrador e de um auxiliar de serviços gerais em contraposição à liberdade dos engravatados e dos políticos do mensalão deste governo, que sonegam milhões dos cofres públicos, o risco de se colocar os indiciados na Universidade do Crime (o sistema penitenciário nacional)...
                   Poderia sustentar que duas melancias não enriquecem nem empobrecem ninguém.  Poderia aproveitar para fazer um discurso contra a situação econômica brasileira, que mantém 95% da população sobrevivendo com o mínimo necessário apesar da promessa deste presidente que muito fala, nada sabe e pouco faz.
                   Poderia brandir minha ira contra os neo-liberais, o consenso de Washington, a cartilha demagógica da esquerda, a utopia do socialismo, a colonização européia....

                   Poderia dizer que George Bush joga bilhões de dólares em bombas na cabeça dos iraquianos, enquanto bilhões de seres humanos passam fome pela Terra - e aí, cadê a Justiça nesse mundo?
                   Poderia mesmo admitir minha mediocridade por não saber argumentar diante de tamanha obviedade.
                   Tantas são as possibilidades que ousarei agir em total desprezo às normas técnicas: não vou apontar nenhum desses fundamentos como razão de decidir.
                   Simplesmente mandarei soltar os indiciados. Quem quiser que escolha o motivo.

                   Expeçam-se os alvarás.
                   Intimem-se.

                               Rafael Gonçalves de Paula

                                        Juiz de Direito

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Perversidade

Perversidade

Rodolfo Pamplona Filho

O perverso é tão mau,
que nem sente o que faz,
quando exercita sua prática
de espezinhar a vida alheia.
Por vezes, alegando uma humildade,
que, definitivamente, não tem,
comporta-se como
a palmatória do universo,
abrindo sua boca suja
como uma trombeta do apocalipse.
Sua atividade favorita
é destilar o seu veneno
em resenhas intermináveis
em rodas de escarnecedores.
Seu sentimento predileto
é a sensação de satisfação,
ao constatar o quão repleto
é o seu repertório de manipulação.
E, quando contrariado,
reage com uma fúria
digna de um animal selvagem,
que se vê acuado em uma armadilha
ou - pior! - pôe-se como vítima
de uma sistema de hipocrisia,
que supostamente puniria
quem tem efetiva coragem
de falar a verdade...
E talvez isso seja real,
mas não da forma como se coloca,
pois o prestígio que angaria
é fruto de seus próprios sofismas,
ou seja, uma forma conveniente
de expor suas mentiras
através de premissas existentes.
E o mais estranho disso tudo
é que ele se acha o injustiçado,
como se, na realidade,
estivesse prestando um serviço
a toda a comunidade,
e não somente
ao seu ego gigante e doente.
Tudo tem o seu fim:
não há mal que se eternize,
nem bem que dure para sempre!
Todavia, parece haver uma exceção
sem que haja qualquer contestação:
por mais que evolua a humanidade,
não há limites para perversidade!

Salvador, 20 de julho de 2011.

domingo, 26 de fevereiro de 2012

Delegado do Distrito Federal relata crime em forma de poesia


Delegado do Distrito Federal relata crime em forma



de poesia.




'Tive vontade de transmitir uma mensagem a quem fosse ler', diz delegado.
Documento teve que ser reescrito para ser enviado ao Poder Judiciário.

Rafaela CéoDo G1 DF
O delegado Reinaldo Lobo, da 29ª DP, no Riacho Fundo, a 18 quilômetros de Brasília, surpreendeu a Corregedoria da Polícia Civil ao registrar, no dia 26 de julho, um crime em forma de poesia.
O documento apresentado pelo delegado faz parte do inquérito policial, formado ainda pelo auto de prisão em flagrante, as oitivas e o relatório. A peça final, única feita em poesia, não foi aprovada e teve que ser refeita.
O relatório dizia respeito a um crime de receptação, ocorrido na noite de 22 de julho, quando um homem foi flagrado por policiais militares na garupa de uma motocileta roubada.
"O preso pediu desculpa/disse que não tinha culpa/pois estava só na garupa/foi checada a situação/ele é mesmo sem noção/estava preso na domiciliar/não conseguiu mais se explicar", escreveu o delegado sobre a abordagem ao suspeito.
Mais adiante, o delegado prossegue: "Se na garupa ou no volante/sei que fiz esse flagrante/desse cara petulante/que no crime não é estreante".
O preso pediu desculpa
Disse que não tinha culpa
Pois só estava na garupa
Foi checada a situação
Ele é mesmo sem noção
Estava preso na domiciliar
Não conseguiu mais se explicar
A motocicleta era roubada
A sua boa fé era furada"
Trecho do relatório produzido pelo delegado Reinaldo Lobo
A vontade de fazer um trabalho diferente motivou a redação do poema, disse o delegado. “O nosso trabalho é um pouco de idealismo. Apesar de muito árduo, ele é um pouco de fantasia, de você lutar pela reconstrução e pela melhora do mundo. Acho que isso traz muita realização e eu quis transformar isso em arte, daí a ideia da poesia.”
No relatório em forma de poema, o delegado explica a inovação: "Resolvi fazê-lo em poesia/pois carrego no peito a magia/de quem ama a fantasia/de lutar pela paz contra qualquer covardia".
Lobo disse ao G1 que sua intenção era chamar a atenção de quem fosse ler o inquérito, afirmou. “Nos deparamos com situações difíceis. Naquela noite, tive vontade de transmitir uma mensagem a quem fosse ler aquele inquérito.”
Apesar da criatividade, o relatório retornou da Corregedoria com o pedido de que fosse escrito nos padrões da polícia. Lobo achou melhor solicitar o ajuste a outro delegado. “Não existe nada que regre a redação oficial de um relatório. O Código de Processo Penal só exige que se narre o caso e se citem as informações importantes. O delegado deve ter liberdade de fazer isso”, defende.
Esta foi a primeira vez que Reinaldo Lobo escreveu um relatório em poesia. Apesar de o formato não ter sido aceito pela Corregedoria, não houve nenhum tipo de punição ao delegado, que não abandonou completamente a ideia.
Nosso trabalho é um pouco de idealismo. Apesar de muito árduo, ele é um pouco de fantasia, de você lutar pela reconstrução e pela melhora do mundo. Acho que isso traz muita realização e eu quis transformar isso em arte, daí a ideia da poesia"
Delegado Reinaldo Lobo
“Vou tentar um diálogo com a Corregedoria para tentar ver o que é possível fazer em harmonia”, afirmou o delegado, fazendo rima.
A Corregedoria da Polícia Civil não se pronunciou sobre o caso até o fim da manhã desta quarta-feira.
O homem que estava na garupa da motocicleta roubada foi autuado em flagrante por receptação. Até o envio do relatório, informa Lobo, o rapaz permanecia preso no sistema penitenciário, porque, como escreveu em seu inquérito-poema, "a fiança foi fixada/e claro não foi paga".

Veja a íntegra do relatório do delegado
"Já era quase madrugada
Neste querido Riacho Fundo
Cidade muito amada
Que arranca elogios de todo mundo
O plantão estava tranqüilo
Até que de longe se escuta um zunido
E todos passam a esperar
A chegada da Polícia Militar
Logo surge a viatura
Desce um policial fardado
Que sem nenhuma frescura
Traz preso um sujeito folgado
Procura pela Autoridade
Narra a ele a sua verdade
Que o prendeu sem piedade
Pois sem nenhuma autorização
Pelas ruas ermas todo tranquilão
Estava em uma motocicleta com restrição
A Autoridade desconfiada
Já iniciou o seu sermão
Mostrou ao preso a papelada
Que a sua ficha era do cão
Ia checar sua situação
O preso pediu desculpa
Disse que não tinha culpa
Pois só estava na garupa
Foi checada a situação
Ele é mesmo sem noção
Estava preso na domiciliar
Não conseguiu mais se explicar
A motocicleta era roubada
A sua boa fé era furada
Se na garupa ou no volante
Sei que fiz esse flagrante
Desse cara petulante
Que no crime não é estreante
Foi lavrado o flagrante
Pelo crime de receptação
Pois só com a polícia atuante
Protegeremos a população
A fiança foi fixada
E claro não foi paga
E enquanto não vier a cutucada
Manteremos assim preso qualquer pessoa má afamada
Já hoje aqui esteve pra testemunhá
A vítima, meu quase chará
Cuja felicidade do seu gargalho
Nos fez compensar todo o trabalho
As diligências foram concluídas
O inquérito me vem pra relatar
Mas como nesta satélite acabamos de chegar
E não trouxemos os modelos pra usar
Resta-nos apenas inovar
Resolvi fazê-lo em poesia
Pois carrego no peito a magia
De quem ama a fantasia
De lutar pela Paz ou contra qualquer covardia
Assim seguimos em mais um plantão
Esperando a próxima situação
De terno, distintivo, pistola e caneta na mão
No cumprimento da fé de nossa missão

Riacho Fundo, 26 de Julho de 2011
Del REINALDO LOBO
63.904-4"