quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

"Da vez primeira em que me assassinaram..."


"Da vez primeira em que me assassinaram..." de Mario Quintana


Da vez primeira em que me assassinaram
Perdi um jeito de sorrir que eu tinha...
Depois, de cada vez que me mataram,
Foram levando qualquer coisa minha...

E hoje, dos meus cadáveres, eu sou
O mais desnudo, o que não tem mais nada...
Arde um toco de vela, amarelada...
Como o único bem que me ficou!

Vinde, corvos, chacais, ladrões da estrada!
Ah! Desta mão, avaramente adunca,
Ninguém há de arrancar-me a luz sagrada!

Aves da Noite! Asas do Horror! Voejai!
Que a luz, trêmula e triste como um ai,
A luz do morto não se apaga nunca!

Mario Quintana (A Rua dos Cataventos, 1940)

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Bem barroca


Bem barroca

Hoje foi chato. Não que aquele otimismo de ontem tenha se esvaído, mas simplesmente pelas metamorfoses e inconstâncias do mundo. Um dia bom, outro ruim, outro ótimo e assim vai. Tudo passa, amanhã já vem.

Hoje tou bem barroca, um espírito de tensões e contrastes. Às vezes conceitual, às vezes emocional.

Hoje tou afim de antíteses, metáforas, hipérboles.

Hoje tou um misto quente, em linguagem popular. Um tanto satírica aos olhos de Gregório de Matos, famoso "Boca do Inferno" que abrasileirou o Barroco vindo da Europa. E é com ele que termino meus comentários de Hoje.
Soneto
Neste mundo é mais rico, o que mais rapa:
Quem mais limpo se faz, tem mais carepa:
Com sua lingua ao nobre o vil decepa:
O velhaco maior sempre capa.

Mostra o patife da nobreza o mapa:
Quem tem mão de agarrar, ligeiro trepa:
Quem menos falar pode, mais increpa:
Quem dinheiro tiver, pode ser Papa.

A flor baixa se inculca por Tulipa;
Bengala hoje na mão, ontem garlopa:
Mais isento se mostra, o que mais chupa.

Para a tropa do trapo vazo a tripa,
E mais não digo, porque a Musa topa
Em apa, epa, ipa, opa, upa.


Isabella Paranaguá

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Pensando sobre "Depois de tudo"

Pensando sobre "Depois de tudo"
Malu Calado

"Depois de tudo"
ainda me assusta...
Às vezes espero
algo que nem sei se vem...
A ansiedade toma conta
e me vejo caindo
num poço sem fundo.
Respiro fundo.
Olho determinado ponto
e penso em versos.
Construo frases bregas,
bem piegas
como: "Ah! Você vai!"
E aí levanto bamba,
um pouco trêmula,
sem gás.
Prendo meus cabelos
brancos, sempre,
e só de vê- los
brancos, os cabelos...
Levanto e vou

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Poema para o Deus TV

Poema para o Deus TV

Rodolfo Pamplona Filho
Ó, Grande Oráculo do Momento,
obrigado por ressaltar a emoção,
reduzir o pensamento
e suprimir a imaginação...

Sou grato pela artificialidade
das soluções rápidas de amargar
e por me dar a incapacidade
de me indignar...

Agradeço, ó Deus Soberano,
pelas manipulações mentais
do desejo humano
para fins comerciais

Ilumina-nos com vossa luz piscante,
desligando, em um rompante,
meus transmissores neurais
e qualquer chance de algo mais.

Regala-me com minha
absoluta falta de reação,
enquanto minha mente definha,
pela ausência de reflexão,

pois minha segurança emocional
depende de satisfazer
uma necessidade banal
que não havia até você me dizer...

Praia do Forte, 19 de fevereiro de 2012.

domingo, 24 de fevereiro de 2013

Pedro, Meu Filho...

Pedro, Meu Filho...
Vinicius de Moraes

Como eu nunca lutei para deixar-te nada além do amanhã indispensável: um quintal de terra verde onde corra, quem sabe, um córrego pensativo; e nessa terra, um teto simples onde possas ocultar a terrível herança que te deixou teu pai apaixonado - a insensatez de um coração constantemente apaixonado.
E porque te fiz com o meu sêmen homem entre os homens, e te quisera para sempre escravo do dever de zelar por esse alqueire, não porque seja meu, mas porque foi plantado com os frutos da minha mais dolorosa poesia.
Da mesma forma que eu, muitas noite, me debrucei sobre o teu berço e verti sobre teu pequenino corpo adormecido as minhas mais indefesas lágrimas de amor, e pedi a todas as divindades que cravassem na minha carne as farpas feitas para a tua.
E porque vivemos tanto tempo juntos e tanto tempo separados, e o que o convívio criou nunca a ausência pôde destruir.
Assim como eu creio em ti porque nasceste do amor e cresceste no âmago de mim como uma árvore dentro de outra, e te alimentaste de minhas vísceras, e ao te fazeres homem rompeste meu alburno e estiraste os braços para um futuro em que acreditei acima de tudo.
E sendo que reconheço nos teus pés os pés do menino que eu fui um dia, em frente ao mar; e na aspereza de tuas plantas as grandes pedras que grimpei e os altos troncos que subi; em tuas palmas as queimaduras do Infinito que procurei como um louco tocar.
Porque tua barba vem da minha barba, e o teu sexo do meu sexo, e há em ti a semente da morte criada por minha vida.
E minha vida, mais que ser um templo, é uma caverna interminável, em cujo recesso esconde-se um tesouro que me foi legado por meu pai, mas cujo esconderijo eu nunca encontrei, e cuja descoberta ora te peço.
Como as amplas estradas da mocidade se transformaram nestas estreitas veredas da madureza, e o Sol que se põe atrás de mim alonga a minha sombra como uma seta em direção ao tenebroso Norte.
E a Morte me espera em algum lugar oculta, e eu não quero ter medo de ir ao seu inesperado encontro.
Por isso que eu chorei tantas lágrimas para que não precisasse chorar, sem saber que criava um mar de pranto em cujos vórtices te haverias também de perder.
E amordacei minha boca para que não gritasses e ceguei meus olhos para que não visses; e quanto mais amordaçado, mais gritavas; e quanto mais cego, mais vias.
Porque a poesia foi para mim uma mulher cruel em cujos braços me abandonei sem remissão, sem sequer pedir perdão a todas as mulheres que por ela abandonei.
E assim como sei que toda a minha vida foi uma luta para que ninguém tivesse mais que lutar:
Assim é o canto que te quero cantar, Pedro meu filho...      

sábado, 23 de fevereiro de 2013

Diagnóstico

Diagnóstico

Rodolfo Pamplona Filho
É fácil falar
quando já se sabe a resposta.
É tranquilo opinar
quando não se tem uma aposta.
O desafio é descobrir
com os mesmos dados a surgir
e que todos têm,
qual é o sentido e razão
para aquilo que ninguém
conseguiu visualizar
ou ter a compreensão
em sua inteireza
por completa estranheza.
Daí, há de se valorizar,
quem tal qual
um Dr. House ou um Sherlock,
consegue superar o mal
da ignorância ou do choque
de não conseguir explicar
a causa da dor a se passar...
Por isso, nunca é pouco valorizar,
seja deísta ou agnóstico,
a delicada ciência de alcançar
a obra de arte do diagnostico.

Praia do Forte, 18 de fevereiro de 2012.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

A mulher que passa

 

A mulher que passa

V. de Moraes

Rio de Janeiro

Meu Deus, eu quero a mulher que passa.
Seu dorso frio é um campo de lírios
Tem sete cores nos seus cabelos
Sete esperanças na boca fresca!

Oh! como és linda, mulher que passas
Que me sacias e suplicias
Dentro das noites, dentro dos dias!

Teus sentimentos são poesia
Teus sofrimentos, melancolia.
Teus pêlos leves são relva boa
Fresca e macia.
Teus belos braços são cisnes mansos
Longe das vozes da ventania.

Meu Deus, eu quero a mulher que passa!

Como te adoro, mulher que passas
Que vens e passas, que me sacias
Dentro das noites, dentro dos dias!
Por que me faltas, se te procuro?
Por que me odeias quando te juro
Que te perdia se me encontravas
E me encontrava se te perdias?

Por que não voltas, mulher que passas?
Por que não enches a minha vida?
Por que não voltas, mulher querida
Sempre perdida, nunca encontrada?
Por que não voltas à minha vida?
Para o que sofro não ser desgraça?

Meu Deus, eu quero a mulher que passa!
Eu quero-a agora, sem mais demora
A minha amada mulher que passa!

No santo nome do teu martírio
Do teu martírio que nunca cessa
Meu Deus, eu quero, quero depressa
A minha amada mulher que passa!

Que fica e passa, que pacifica
Que é tanto pura como devassa
Que bóia leve como a cortiça
E tem raízes como a fumaça.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Soneto da Auto-Alienação

Soneto da Auto-Alienação

Rodolfo Pamplona Filho
Eu não quero ler jornal,
nem me sentir mal
com problemas do mundo
ou de pensamento profundo.

Eu nem quero mais votar,
para , depois, poder alegar
a ilegitimidade de quem governar
supostamente para me representar.

Quando tudo ruir de demência,
colocarei a culpa no sistema,
justificando minha ausência,

pois é muito mais divertido
colocar a culpa no problema,
em vez de tê-lo resolvido.

Praia do Forte, 18 de fevereiro de 2012.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Divagando Devagar

Divagando Devagar

Rodolfo Pamplona Filho
Deixei minha mente divagar
e, devagar,
ela não voltou mais...
Deve ser por isso
que eu nunca encontrei
as minhas próprias rédeas...

Praia do Forte, 18 de fevereiro de 2012.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Estratégia é tudo !!!

Um senhor vivia sozinho em Minnessota.
Ele queria virar a terra de seu jardim
para plantar flores, mas
era um trabalho muito pesado.

Seu único filho, que o ajudava nesta tarefa,estava na prisão.
O homem então escreveu a seguinte carta ao filho:


' Querido Filho, estou triste, pois não vou poder plantar meu jardim este ano. Detesto não poder fazê-lo, porque sua mãe sempre adorou flores e esta é a época certa para o plantio.
Mas eu estou velho demais para cavar a terra. Se você estivesse aqui, eu não teria esse problema, mas sei que você não pode me ajudar, pois estás na prisão.
Com amor, Seu Pai. '


Pouco depois, o pai recebeu o seguinte telegrama:


' PELO AMOR DE DEUS, Pai, não escave o jardim! Foi lá que eu escondi os corpos '


Como as correspondências eram monitoradas na prisão, às quatro da manhã do dia seguinte, uma dúzia de agentes do FBI e policiais apareceram e cavaram o jardim inteiro, sem encontrar qualquer corpo.

Confuso, o velho escreveu uma carta para o filho contando o que acontecera.

Esta foi a resposta:


' Pode plantar seu jardim agora, amado Pai.. Isso foi o máximo que eu pude fazer no momento. '

Estratégia é tudo !!!

Nada como uma boa estratégia para conseguir coisas que parecem impossíveis.


Assim, é importante repensar sobre as pequenas coisas que muitas vezes nós mesmos colocamos como obstáculos em nossas vidas.


'Ter problemas na vida é inevitável,
ser derrotado por eles é opcional '

domingo, 17 de fevereiro de 2013

Carpe Diem

Carpe Diem

Rodolfo Pamplona Filho
Morrer é facil
Viver é o desafio
A vida é uma montanha russa,
em que gargalhamos em um dia,
sem saber que alguma lágrima
nos espera na manhã seguinte...
Por isso, é preciso aproveitar
cada raio de luz caloroso
ou cada sombra refrescante,
pois nada disso se repetirá,
mas, sim, se surgir,
será uma nova chance de sorrir,
absolutamente independente,
do que se faz ou fez
no passado ou no presente...

Salvador, 14 de fevereiro de 2012.

sábado, 16 de fevereiro de 2013

Armadilhas do Tempo

ARMADILHAS DO TEMPO

Alberto Saraiva

Ah, o tempo, esse canalha! 
Disse alguém, inconformada,
com os vincos que o tempo-fornalha,
faz em nós, gente azoada, apressada. Assada.

Quanto a mim, reles poetinha,
que versejo a tempo de ver o tempo passar,
fico aqui assim, um tanto pasmo, na minha,
a ver o que o tempo quer me ensinar.

Ele me diz que é possível, sim
fazer com que ele, o tempo, volte. E retome
as rédeas para corrigir coisas que já tinham tido fim.
Um fim que não merecia esse nome.

E eu, menino fazedor do tempo um brinquedo,
Ouço, penso, poeto olhando o relógio. E falo: 
É, tempo, se me dás a chance de perder o medo,
não serei eu que deixarei de tentá-lo.

Porque ela me ligou, três anos e tanto depois,
com a mesma alegria dos tempos idos
que fez com que as lembranças de nós dois
nos fizessem - de novo! - vencedores não vencidos.

Tá legal, tempo, eu me curvo, da teoria faço lei,
fez-se a dobra no espaço-tempo, einsteiniana relatividade.
Cabe a mim provar, por a+b, com tudo que sei,
que para amar e ser feliz não existe tempo. Nem idade.

Liguei de volta, a encontrei; nos amamos como deuses
que controlam o tempo, a vida, os encontros, os amores.
Nem tocamos no passado, nas despedidas, nos adeuses
Nada de luto: da vida, quero os sons. E as cores.

As cores que voltaram, armadilha do tempo. Lindo arranjo,
pra que eu faça dessa temponauta, agora ao meu lado,
Minha menina-mulher-amante-companheira, meu anjo,
para que eu tenha tempo de amá-la, como deveria tê-la amado.

Em 17 de janeiro de 2012, 11h30.
 

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

BELVA

BELVA

Rodolfo Pamplona Filho
Bela
Elegante
Loura
Viva
Amiga

Bem-vinda!
Esteja
Livre para
Ver
A alegria!

Beba
Em homenagem à
Linda
Vida que te
Abraçou!

Brilhe
E
Leve
Valor
A quem merecer seu amor

Salvador, 26 de fevereiro de 2012.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Soneto para uma Flor

Soneto para uma Flor

Rodolfo Pamplona Filho
Quero tocar teu gineceu
com um doce beijo meu
e ver como o gosto de minha boca
te deixaria toda louca...

Deslizar em tuas folhas,
como quem acaricia os cabelos,
sem ter medo que te encolhas
com a força de meus dedos

No jardim, com teu lume,
apreciar o teu perfume,
sem nunca despetalar,

na certeza de que teu pulso
cede a cada meu impulso
para sempre me desejar.

Salvador, 12 de fevereiro de 2012.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

DIVISÃO DE BENS ENTRE ADÃO E EVA..

DIVISÃO DE BENS ENTRE ADÃO E EVA..



 
Quando Deus criou Adão e Eva, disse aos dois:
- Tenho dois presentes para distribuir entre vocês: um é para fazer xixi em pé e...
Adão, ansioso , interrompeu, gritando:
- Eu! Eu! Eu! Eu quero, por favor... Senhor, por favor. Sim, iria me facilitar vida substancialmente!  Por favor! Por favor!
Eva concordou e disse que essas coisas não tinham importância para ela. Então, Deus presenteou Adão, que ficou maravilhado. Gritava de alegria, corria pelo jardim do Éden fazendo xixi em todas as árvores. Correu pela praia fazendo desenhos com seu xixi na areia. Brincava de chafariz. Acendia uma fogueirinha e brincava de bombeiro...
Deus e Eva contemplavam o homem louco de felicidade, até que Eva perguntou a Deus:
- E... Qual é o outro presente, Senhor?
Deus respondeu:
- Cérebro, Eva, o cérebro é seu. 

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Sentimento de Gratidão

Sentimento de Gratidão

Rodolfo Pamplona Filho
Há dias em que
a muralha desmorona
e toda a imagem de força
se dissolve, a olho nu,
na fragilidade da desolação...
É a hora em que
se percebe que não dá
para sozinho encarar
o desafio a desbravar...
E o normal, neste momento,
é simplesmente desabar...
e, no fundo do poço, acabar,
acreditando que, nunca mais,
vai novamente se levantar...
E, nesta sensação de depressão,
é maravilhoso sentir a mão
que apóia e resgata
de onde não se tinha mais visão.
O que conforta
e sinceramente consola
não vem com vãs ilusões
ou inebriantes promessas
do impossível ou inexplicável,
mas, sim, com o respeito,
a verdade e o encorajamento
para enfrentar a realidade.
Por isso, maior que o resultado,
que não depende da vontade
ou da efetiva necessidade,
é o refrigério de saber
que tudo que era possível
foi realmente feito,
e a quem nos apóia
só se reserva a única resposta
que a coerência de caráter impõe,
que é a mais gratificante sensação:
o sentimento de gratidão.

Salvador, 11 de fevereiro de 2012.

domingo, 10 de fevereiro de 2013

NANOPOESIA

NANOPOESIA


Sigo,
A passos largos
Para o abismo universal.
Nada mais humano e natural!

Ter o corpo, em partículas, espalhado
Em milhões -
Não. Em Bilhões.
Por todo o espaço.

Colossal? Impossível?
Magia?
Não para a Nanotecnologia!

Infinitas são as variáveis.
Tudo é novo e incrível.
Na escala nanométrica.

(Paulo Basílio – 07/02/2012)

 


Fotografia feita em microscópio especial mostra o "nanopoema"
de uma palavra; trata-se do primeiro do gênero feito no Brasil

sábado, 9 de fevereiro de 2013

Sensação de Impotência

Sensação de Impotência

Rodolfo Pamplona Filho
O que fazer
quando não se há o que fazer?
Chorar, gritar, praguejar,
como se, para fora, colocar
conseguisse realmente amenizar
a angústia que não quer cessar?
Tenho desejo de sumir
ou simplesmente imaginar
que tudo não passa
de um terrível pesadelo
e que, brevemente,
irei acordar...
Mas não há do que despertar,
pois nem o sono quis chegar
e somente resta encarar
a face dura da realidade
e a sensação de impotência...

Salvador, 08 de fevereiro de 2012.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Advogado não Mente... Só é criativo...

Advogado não Mente... Só é criativo...

UM ADVOGADO tinha 12 filhos e precisava sair da casa onde
morava e alugar outra, mas não conseguia por causa do monte de crianças.
Quando ele dizia que tinha 12 filhos, ninguém queria alugar porque
sabiam que a criançada iria destruir a casa.
Ele não podia dizer que não tinha filhos, não podia mentir,
afinal os ADVOGADOS não podem mentir.
Ele estava ficando desesperado, o prazo para se mudar estava se esgotando.
Daí teve uma idéia: mandou a mulher ir passear no cemitério com 11 filhos.
Pegou o filho que sobrou e foi ver casas junto com o agente da imobiliária.
Gostou de uma e o agente lhe perguntou quantos filhos ele tinha.
Ele respondeu que tinha 12.
Daí o agente perguntou: onde estão os outros?!
E ele respondeu, com um ar muito triste: “Estão no cemitério, junto com a mãe deles”.
E foi assim que eles conseguiu alugar uma casa sem mentir...
 
Não é necessário mentir, basta escolher as palavras certas.
 

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

A Terceira Margem do Rio

A Terceira Margem do Rio
Guimarães Rosa

Nosso pai era homem cumpridor, ordeiro, positivo; e sido assim desde mocinho e menino, pelo que testemunharam as diversas sensatas pessoas, quando indaguei a informação. Do que eu mesmo me alembro, ele não figurava mais estúrdio nem mais triste do que os outros, conhecidos nossos. Só quieto. Nossa mãe era quem regia, e que ralhava no diário com a gente — minha irmã, meu irmão e eu. Mas se deu que, certo dia, nosso pai mandou fazer para si uma canoa.

Era a sério. Encomendou a canoa especial, de pau de vinhático, pequena, mal com a tabuinha da popa, como para caber justo o remador. Mas teve de ser toda fabricada, escolhida forte e arqueada em rijo, própria para dever durar na água por uns vinte ou trinta anos. Nossa mãe jurou muito contra a idéia. Seria que, ele, que nessas artes não vadiava, se ia propor agora para pescarias e caçadas? Nosso pai nada não dizia. Nossa casa, no tempo, ainda era mais próxima do rio, obra de nem quarto de légua: o rio por aí se estendendo grande, fundo, calado que sempre. Largo, de não se poder ver a forma da outra beira. E esquecer não posso, do dia em que a canoa ficou pronta.

Sem alegria nem cuidado, nosso pai encalcou o chapéu e decidiu um adeus para a gente. Nem falou outras palavras, não pegou matula e trouxa, não fez a alguma recomendação. Nossa mãe, a gente achou que ela ia esbravejar, mas persistiu somente alva de pálida, mascou o beiço e bramou: — "Cê vai, ocê fique, você nunca volte!" Nosso pai suspendeu a resposta. Espiou manso para mim, me acenando de vir também, por uns passos. Temi a ira de nossa mãe, mas obedeci, de vez de jeito. O rumo daquilo me animava, chega que um propósito perguntei: — "Pai, o senhor me leva junto, nessa sua canoa?" Ele só retornou o olhar em mim, e me botou a bênção, com gesto me mandando para trás. Fiz que vim, mas ainda virei, na grota do mato, para saber. Nosso pai entrou na canoa e desamarrou, pelo remar. E a canoa saiu se indo — a sombra dela por igual, feito um jacaré, comprida longa.

Nosso pai não voltou. Ele não tinha ido a nenhuma parte. Só executava a invenção de se permanecer naqueles espaços do rio, de meio a meio, sempre dentro da canoa, para dela não saltar, nunca mais. A estranheza dessa verdade deu para. estarrecer de todo a gente. Aquilo que não havia, acontecia. Os parentes, vizinhos e conhecidos nossos, se reuniram, tomaram juntamente conselho.

Nossa mãe, vergonhosa, se portou com muita cordura; por isso, todos pensaram de nosso pai a razão em que não queriam falar: doideira. Só uns achavam o entanto de poder também ser pagamento de promessa; ou que, nosso pai, quem sabe, por escrúpulo de estar com alguma feia doença, que seja, a lepra, se desertava para outra sina de existir, perto e longe de sua família dele. As vozes das notícias se dando pelas certas pessoas — passadores, moradores das beiras, até do afastado da outra banda — descrevendo que nosso pai nunca se surgia a tomar terra, em ponto nem canto, de dia nem de noite, da forma como cursava no rio, solto solitariamente. Então, pois, nossa mãe e os aparentados nossos, assentaram: que o mantimento que tivesse, ocultado na canoa, se gastava; e, ele, ou desembarcava e viajava s'embora, para jamais, o que ao menos se condizia mais correto, ou se arrependia, por uma vez, para casa.

No que num engano. Eu mesmo cumpria de trazer para ele, cada dia, um tanto de comida furtada: a idéia que senti, logo na primeira noite, quando o pessoal nosso experimentou de acender fogueiras em beirada do rio, enquanto que, no alumiado delas, se rezava e se chamava. Depois, no seguinte, apareci, com rapadura, broa de pão, cacho de bananas. Enxerguei nosso pai, no enfim de uma hora, tão custosa para sobrevir: só assim, ele no ao-longe, sentado no fundo da canoa, suspendida no liso do rio. Me viu, não remou para cá, não fez sinal. Mostrei o de comer, depositei num oco de pedra do barranco, a salvo de bicho mexer e a seco de chuva e orvalho. Isso, que fiz, e refiz, sempre, tempos a fora. Surpresa que mais tarde tive: que nossa mãe sabia desse meu encargo, só se encobrindo de não saber; ela mesma deixava, facilitado, sobra de coisas, para o meu conseguir. Nossa mãe muito não se demonstrava.

Mandou vir o tio nosso, irmão dela, para auxiliar na fazenda e nos negócios. Mandou vir o mestre, para nós, os meninos. Incumbiu ao padre que um dia se revestisse, em praia de margem, para esconjurar e clamar a nosso pai o 'dever de desistir da tristonha teima. De outra, por arranjo dela, para medo, vieram os dois soldados. Tudo o que não valeu de nada. Nosso pai passava ao largo, avistado ou diluso, cruzando na canoa, sem deixar ninguém se chegar à pega ou à fala. Mesmo quando foi, não faz muito, dos homens do jornal, que trouxeram a lancha e tencionavam tirar retrato dele, não venceram: nosso pai se desaparecia para a outra banda, aproava a canoa no brejão, de léguas, que há, por entre juncos e mato, e só ele conhecesse, a palmos, a escuridão, daquele.

A gente teve de se acostumar com aquilo. Às penas, que, com aquilo, a gente mesmo nunca se acostumou, em si, na verdade. Tiro por mim, que, no que queria, e no que não queria, só com nosso pai me achava: assunto que jogava para trás meus pensamentos. O severo que era, de não se entender, de maneira nenhuma, como ele agüentava. De dia e de noite, com sol ou aguaceiros, calor, sereno, e nas friagens terríveis de meio-do-ano, sem arrumo, só com o chapéu velho na cabeça, por todas as semanas, e meses, e os anos — sem fazer conta do se-ir do viver. Não pojava em nenhuma das duas beiras, nem nas ilhas e croas do rio, não pisou mais em chão nem capim. Por certo, ao menos, que, para dormir seu tanto, ele fizesse amarração da canoa, em alguma ponta-de-ilha, no esconso. Mas não armava um foguinho em praia, nem dispunha de sua luz feita, nunca mais riscou um fósforo. O que consumia de comer, era só um quase; mesmo do que a gente depositava, no entre as raízes da gameleira, ou na lapinha de pedra do barranco, ele recolhia pouco, nem o bastável. Não adoecia? E a constante força dos braços, para ter tento na canoa, resistido, mesmo na demasia das enchentes, no subimento, aí quando no lanço da correnteza enorme do rio tudo rola o perigoso, aqueles corpos de bichos mortos e paus-de-árvore descendo — de espanto de esbarro. E nunca falou mais palavra, com pessoa alguma. Nós, também, não falávamos mais nele. Só se pensava. Não, de nosso pai não se podia ter esquecimento; e, se, por um pouco, a gente fazia que esquecia, era só para se despertar de novo, de repente, com a memória, no passo de outros sobressaltos.

Minha irmã se casou; nossa mãe não quis festa. A gente imaginava nele, quando se comia uma comida mais gostosa; assim como, no gasalhado da noite, no desamparo dessas noites de muita chuva, fria, forte, nosso pai só com a mão e uma cabaça para ir esvaziando a canoa da água do temporal. Às vezes, algum conhecido nosso achava que eu ia ficando mais parecido com nosso pai. Mas eu sabia que ele agora virara cabeludo, barbudo, de unhas grandes, mal e magro, ficado preto de sol e dos pêlos, com o aspecto de bicho, conforme quase nu, mesmo dispondo das peças de roupas que a gente de tempos em tempos fornecia.

Nem queria saber de nós; não tinha afeto? Mas, por afeto mesmo, de respeito, sempre que às vezes me louvavam, por causa de algum meu bom procedimento, eu falava: — "Foi pai que um dia me ensinou a fazer assim..."; o que não era o certo, exato; mas, que era mentira por verdade. Sendo que, se ele não se lembrava mais, nem queria saber da gente, por que, então, não subia ou descia o rio, para outras paragens, longe, no não-encontrável? Só ele soubesse. Mas minha irmã teve menino, ela mesma entestou que queria mostrar para ele o neto. Viemos, todos, no barranco, foi num dia bonito, minha irmã de vestido branco, que tinha sido o do casamento, ela erguia nos braços a criancinha, o marido dela segurou, para defender os dois, o guarda-sol. A gente chamou, esperou. Nosso pai não apareceu. Minha irmã chorou, nós todos aí choramos, abraçados.

Minha irmã se mudou, com o marido, para longe daqui. Meu irmão resolveu e se foi, para uma cidade. Os tempos mudavam, no devagar depressa dos tempos. Nossa mãe terminou indo também, de uma vez, residir com minha irmã, ela estava envelhecida. Eu fiquei aqui, de resto. Eu nunca podia querer me casar. Eu permaneci, com as bagagens da vida. Nosso pai carecia de mim, eu sei — na vagação, no rio no ermo — sem dar razão de seu feito. Seja que, quando eu quis mesmo saber, e firme indaguei, me diz-que-disseram: que constava que nosso pai, alguma vez, tivesse revelado a explicação, ao homem que para ele aprontara a canoa. Mas, agora, esse homem já tinha morrido, ninguém soubesse, fizesse recordação, de nada mais. Só as falsas conversas, sem senso, como por ocasião, no começo, na vinda das primeiras cheias do rio, com chuvas que não estiavam, todos temeram o fim-do-mundo, diziam: que nosso pai fosse o avisado que nem Noé, que, por tanto, a canoa ele tinha antecipado; pois agora me entrelembro. Meu pai, eu não podia malsinar. E apontavam já em mim uns primeiros cabelos brancos.

Sou homem de tristes palavras. De que era que eu tinha tanta, tanta culpa? Se o meu pai, sempre fazendo ausência: e o rio-rio-rio, o rio — pondo perpétuo. Eu sofria já o começo de velhice — esta vida era só o demoramento. Eu mesmo tinha achaques, ânsias, cá de baixo, cansaços, perrenguice de reumatismo. E ele? Por quê? Devia de padecer demais. De tão idoso, não ia, mais dia menos dia, fraquejar do vigor, deixar que a canoa emborcasse, ou que bubuiasse sem pulso, na levada do rio, para se despenhar horas abaixo, em tororoma e no tombo da cachoeira, brava, com o fervimento e morte. Apertava o coração. Ele estava lá, sem a minha tranqüilidade. Sou o culpado do que nem sei, de dor em aberto, no meu foro. Soubesse — se as coisas fossem outras. E fui tomando idéia.

Sem fazer véspera. Sou doido? Não. Na nossa casa, a palavra doido não se falava, nunca mais se falou, os anos todos, não se condenava ninguém de doido. Ninguém é doido. Ou, então, todos. Só fiz, que fui lá. Com um lenço, para o aceno ser mais. Eu estava muito no meu sentido. Esperei. Ao por fim, ele apareceu, aí e lá, o vulto. Estava ali, sentado à popa. Estava ali, de grito. Chamei, umas quantas vezes. E falei, o que me urgia, jurado e declarado, tive que reforçar a voz: — "Pai, o senhor está velho, já fez o seu tanto... Agora, o senhor vem, não carece mais... O senhor vem, e eu, agora mesmo, quando que seja, a ambas vontades, eu tomo o seu lugar, do senhor, na canoa!..." E, assim dizendo, meu coração bateu no compasso do mais certo.

Ele me escutou. Ficou em pé. Manejou remo n'água, proava para cá, concordado. E eu tremi, profundo, de repente: porque, antes, ele tinha levantado o braço e feito um saudar de gesto — o primeiro, depois de tamanhos anos decorridos! E eu não podia... Por pavor, arrepiados os cabelos, corri, fugi, me tirei de lá, num procedimento desatinado. Porquanto que ele me pareceu vir: da parte de além. E estou pedindo, pedindo, pedindo um perdão.

Sofri o grave frio dos medos, adoeci. Sei que ninguém soube mais dele. Sou homem, depois desse falimento? Sou o que não foi, o que vai ficar calado. Sei que agora é tarde, e temo abreviar com a vida, nos rasos do mundo. Mas, então, ao menos, que, no artigo da morte, peguem em mim, e me depositem também numa canoinha de nada, nessa água que não pára, de longas beiras: e, eu, rio abaixo, rio a fora, rio a dentro — o rio.

Texto extraído do livro "Primeiras Estórias", Editora Nova Fronteira - Rio de Janeiro, 1988, pág. 32

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Terror de te amar num sítio tão frágil como o mundo.

Terror de te amar num sítio tão frágil como o mundo.

Mal de te amar neste lugar de imperfeição
Onde tudo nos quebra e emudece
Onde tudo nos mente e separa.

Sophia de Mello Breyner Andresen (6/11/1919-2/7/2004)

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Falando Sério (soneto)

Falando Sério (soneto)

Rodolfo Pamplona Filho
É melhor a Verdade acachapante
do que qualquer mentira conveniente.
É preciso lapidar o verbo a todo instante
para poupar o sofrimento inclemente.

Tenha a certeza inerradável
de que ser sincero machuca,
mas a ferida, por mais palpável,
cicatriza sempre com o tempo e a luta

por um transparente relacionamento,
que não exija esconder um sentimento
ou a manifestação de uma vontade,

pois falar sério é mais do que ser franco:
é colocar o preto no branco
e não transformar a farsa em necessidade.

Salvador, 05 de fevereiro de 2012.

domingo, 3 de fevereiro de 2013

Apoio

Apoio

Rodolfo Pamplona Filho
Eu fico feliz
quando sinto que
você está aqui
e quando ouço que
você só quer o meu bem!

Eu quero o seu também
e sempre vou estar presente,
apoiando e estimulando,
consolando nos erros e derrotas,
comemorando os acertos e vitorias.

Apoiar é estar ao lado,
mesmo quando não é possível,
pois nada está fechado
e a força do pensamento
supera qualquer advento...

Salvador, 04 de fevereiro de 2012.

sábado, 2 de fevereiro de 2013

Águas de Maio


Águas de Maio

Para um dia que não foi nada fácil resolvi fazer esse poema, em que apesar da seriedade do assunto brinco com algumas figuras de linguagem. (Período das enchentes em Teresina-PI)

ÁGUAS DE MAIO:

[Antítese] Hoje fez sol, semana passada, porém, choveu muito.
[Antonomásia] A Mesopotâmia nordestina
[Comparação] parece quase uma Nova Orleans em tempos de enchente.
Enquanto isso as autoridades brincam de transferir as responsabilidades.
[Disfemismo] É o "sujo falando do mal lavado".
[Eufemismo] Verdades que esqueceram de acontecer.
[Gradação] Assim, das consequências da junção da natureza e inércia política sofrem principalmente os mais pobres: ilhados, alagados, desalojados.
[Hipálage] A noite sonolenta é para poucos.
[Metáfora] Pois o Rio Poty é um balde despejado.
[Metonímia] Quem será a âncora das vítimas da chuva?
[Onomatopéia] Tchibum!
[Sinestesia] Tristeza gritante da cidade verde alagada.
E as promessas de conjuntos habitacionais, cadê?
[Oximoro] Mais uma vez, silêncio eloquente!
[Ironia] Mas Teresina não está tão mal.
[Prosopopéia] O sol continua nascendo sempre feliz.
...
[Pleonasmo] Ó rio doce, quanto de tuas águas são lágrimas piauienses.

Soa pessimista, mas faz parte da veia poética. Ainda sou otimista pelo insistente clichê: Sou brasileira e não desisto nunca!

Isabella Paranaguá