terça-feira, 19 de abril de 2016

A vida plena






No chão, deitado. O Sol dá adeus e a crescente Lua encontra seu tempo para brilhar. Os pássaros cantam alegremente ao procurar seus cantos de passar a noite. Os algodões dos céus, mais conhecidos como nuvens, correm para o ocidente e se banham em tinta rosa-alaranjada. O crepúsculo sorri assim como uma criança alegre o faz. O vento leva folhas secas para passear no tênue lago enquanto as formigas caminham discretamente por meus braços.
A vida parece calma. O tempo vagaroso olha para mim e estende a mão para que eu me levante. O tempo senta-se ao meu lado e anuncia pertencer-me. A natureza corre os olhos pela minha alma e me julga da mesma forma que uma mão orgulhosa o faz. Por minhas narinas, o vento se aventura e volta acalorado e pobre. E então, paro de roubar o vento para meus pulmões. Em movimento, apenas um coração pulsando. Os músculos estão esperando um comando que não virá tão cedo. Sinto como se o céu fosse o chão que eu sempre tive que caminhar. Eu só tinha que esticar os pés. Voluntariamente, minha visão é tomada pela escuridão das pálpebras. As nuvens crêem que a vida me deixou, a vida continua serena e pergunta ao vento o porquê, o vento diz que é um pedido aceito de perdão e questiona ao tempo quanto tempo mais precisarei, o tempo diz que o céu deve saber, o céu escurece e afirma que só eu sei, o lago franze o cenho enquanto as formigas começam a se preocupar e o crepúsculo deixa a noite entrar em casa. Então eu senti como se realmente fizesse parte do mundo. Senti como se eu fosse uma alavanca de uma máquina imensa. Senti como se eu pudesse segurar o mundo com as minhas mãos.
Deixei o vento insistente navegar em meus pulmões novamente. Ele pede perdão por ter reclamado. Abro os olhos. O céu, preocupado, está me observando a poucos centímetros. O tempo uma vez tranquilo agora estava acelerado. As formigas pareciam tentar me acordar. A natureza sorria aliviada atrás das árvores enquanto o lago decidia se a flertava ou admirava a noite.
Estiquei vagarosamente o braço direito. O céu agora mais escuro recuou como um animal amedrontado diante de um estranho. Então o toquei suavemente. Era liso como vidro. Gelado e tímido. Minhas mãos deslizaram por ele e senti um sorriso prazeroso formar-se em minha face uma vez inexpressiva como uma folha em branco. Ele tinha que ir. Acenou e me disse que nos veríamos novamente. Contou que olhar-me-ia. Ele se foi.
O tempo se levantou começando a caminhar. Levantei-me e o abracei com força. Após retribuir o abraço, ele falou que sou seu dono, mas que devo cuidar mais dele. O tempo se foi sorrindo enquanto corria para onde meus olhos não podem alcançar. O vento corria suavemente e as estrelas começavam a entrar em cena. Elas pareciam dançar no céu noturno. Piscando para mim e enciumadas pela Lua que roubava parte do seu alvo e discreto brilho.
Desta vez, levantei meu corpo e parei de sentir os batimentos cardíacos do mundo. Senti um calafrio vindo das minhas costas apontadas para o sul. Olhei para trás e ali estava o vento. Parado. Quieto. Paciente. Anunciando:
- Como o tempo, a ti pertenço.
Eu abri os braços e fechei os olhos enquanto levantava minhas mãos murmurando:
- Sopra.
Ele passou por mim com velocidade e senti como se estivesse com as rédeas de um cavalo veloz na mão. Ele me entendia. Eu o entendia. Eu sabia seu nome. Então relaxei os braços e os encostei ao meu corpo fazendo o vento parar. Lá no alto, ele sorria pra mim.
Corri. Corri. Eu estava leve. Livre. Solto. Autoconfiante.
Eu estava voando.
Osvaldo Trindade

Nenhum comentário:

Postar um comentário