sábado, 28 de abril de 2012

Rimas e Versos Livres

Rimas e Versos Livres

Rodolfo Pamplona Filho

Gosto de buscar rima,
embora, quem não as prefira,
possa ter a cisma
ou mesmo a ira
de querer usar somente
livres palavras soltas,
como se, de repente,
não houvesse rimas loucas.

Quem disse que
as palavras dadas
teriam de ser
amarradas?
A estrofe da rima,
quando bem construída,
é tão boa quanto
o verso da vida.

Mas há quem resista
e só veja, enfim,
uma palavra ligada
na outra, sem fim,
como se fosse um esquema
ou um campo deserto,
como se o poema
já fosse completo...

Quem disse que existe
uma única forma triste
de buscar um termo certo
ou de conjugar um verbo?
E quem disse veementemente
que vogais e consoantes
pertencem necessariamente
a um só alguém todo instante?

Respeito o seu gosto,
mas lamento,
pois o que, para você,
é um tormento,
para mim, sem pena,
seria um lindo poema,
sem vãs ilusões
de outras conjugações.

Por isso, ver é triste
que você insiste,
que seu verbo, nesse genitivo,
é sempre intransitivo:
palavra que exige outra
não serve à sua boca.

Entendo e respeito.
Não forço o conceito
nem regras gramaticais,
sem a autorização
ou as metáforas reais
da licença da canção.

Por isso, nossa expressão
será somente verbal,
sem qualquer inovação
ou rima não tradicional,
mesmo sabendo que poetizar
é maior que o prazer de rimar.

Salvador, 23 de agosto de 2011.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Sonhos de Menina


Era apenas uma menina;
Ao chegar àquela cidade;
Com malas na mão;
Buscava a felicidade!
Assustada em meio à multidão;
Não podia conter tamanha emoção!

Mal sabia a menina;
O frio que a esperava;
E que naquela cidade;
Não encontraria o que procurava!

Que não bastava apenas;
Ser uma menina forte;
Pois naquela cidade;
Só ficava quem tinha sorte!
Sendo que alguns;
Até preferiam a morte!

A menina sonhadora;
Cheia de esperança!
Só queria ser feliz!
Como um sonho de criança!

Mas naquela cidade fria;
Onde a vida era correria;
O que a menina não sabia;
Era o quanto sofreria!

O tempo foi passando;
A menina se conformando;
Muitas vezes se entristecia;
Acreditando que a felicidade não existia!

De dia ela sorrir;
A noite ela até chora!
Mas daquela cidade;
Não queria ir embora!

Os anos se passaram;
A menina virou mulher!
Aprendendo com a vida;
A curar suas feridas!

Sofreu decepções e frustrações;
Chegando a machucar alguns corações!
Hoje a menina cresceu e compreendeu;
Que na vida pode-se até ouvir o coração;
Mas quem determina o caminho;
Será sempre a razão!

A menina não queria ir;
Pois ali queria ficar;
Mas aquela cidade;
Ela teve que deixar!

Mas ainda não é o fim;
Pois a menina cheia de vida;
Continua a sonhar!

Sonhando com o dia;
Que naquela cidade fria;
Ainda voltará!

 Carla Elisio

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Em Defesa das Árvores


Em Defesa das Árvores
(Rubem Alves, do livro “O amor que encantou a lua”)

Estava eu na sala de espera do meu médico trabalhando absorto no meu laptop para matar o tempo, os “oclinhos” de ver perto na frente dos olhos, ao longe tudo era um borrão quando, de repente, um borrão alto se colocou à minha frente, baixei os “oclinhos” para ver à distância: era um homem que conheci menino, de precoce vocação científica, posto que menino ainda, se comprazia em experimentos incendiários com gases mal cheirosos. Depois dos cumprimentos de praxe e sem mais delongas ele disse: “Rubem, escreva uma crônica em defesa das árvores.” Havia indignação em sua voz e ele relatou:
            “Havia, no terreno do meu vizinho, um ipê maravilhoso, árvore muito velha, tronco grosso, que anualmente produzia uma floração cor-de-rosa, para espanto e felicidade de todos. Pois, sem maiores avisos, o tal vizinho cortou o ipê. Fiquei indignado e fui saber das razões do assassinato. Que mal lhe teria feita aquela árvore mansa? E ele me explicou que as raízes do velho ipê estavam rachando o seu muro de tijolos e argamassa. Um ipê que leva cinqüenta anos para crescer cortado por causa de um muro que se constrói num dia! Aí lhe perguntei: “Por que não me falou? Eu teria pago a reconstrução do seu muro…”
E concluiu: “Você escreve uma crônica?” Tive uma reação desanimada. Lembrei-me das palavras tristes do Vinícius no seu poema “O Haver”, em que fala da “sua inútil poesia”. Sinto assim, de vez em quando, que aquilo que escrevo é inútil. Os que têm poder nem lêem e se lêem não levam a sério. As razões que movem a política são as razões dos machados e das serras; não são as razões da beleza. Escrever, para quê? Para sensibilizar o vizinho que gosta mais de um muro que de um ipê? O que eu escrevesse só encontraria eco naqueles que amam mais os ipês que os muros. Mas, nesse caso minha escritura seria desnecessária. E para os que amam mais os muros que os ipês ela seria inútil. Aí me lembrei de um poema de Chuang-Tzu, escrito séculos antes de Cristo: “Eu sei que não terei sucesso. Tentar forçar os resultados somente aumentaria a confusão. Não será melhor desistir e parar de me esforçar? Mas, se eu não me esforçar, quem o fará?” As palavras do sábio foram uma repreensão ao meu desânimo. Comecei a pensar. Lembrei-me de fato semelhante acontecido na minha rua. Havia um ipê amarelo que florescia no mês de julho. O chão ficava dourado com suas flores. Mas a dona da casa em frente ao ipê e a sua incansável vassoura deram o nome de “sujeira” ao dourado das flores caídas.
E, um belo dia, a árvore amanheceu com um anel cortado na sua casca. As veias pelas quais sua seiva circulava haviam sido seccionadas durante a noite. O ipê morreu. A vassoura triunfou. Há pessoas cujas idéias nascem da vassoura. Visitando um amigo que mora num condomínio rico de Campinas alegrei-me vendo que ele era todo arborizado com magnólias. As flores das magnólias são quase insignificantes. Mas o perfume é maravilhoso. Quem respira o perfume de uma magnólia tem a alma tocada pelo divino. Aí o meu amigo apontou para uma casa do outro lado da rua. Lá não havia magnólias. E explicou: “A dona da casa disse que dava muito trabalho varrer as folhas que caíam no chão.” Agora mesmo, a um quarteirão de onde escrevo, havia três daquelas árvores que se chamam “Chapéu de Sol”, de folhas largas e sombra generosa. Pois a dona da casa mandou cortar todos os galhos das três, ficando só os toquinhos. Ficaram parecidas com cabides de pendurar chapéu. Mas as árvores não guardam rancor. Trataram de continuar a viver - e nos toquinhos surgiram brotos verdes, como um gesto de perdão. Percebendo que as árvores insistiam em viver, ela mandou que todos os brotos fossem arrancados.
Quando as serras da CPFL mutilaram as velhas paineiras da Orosimbo Maia, que todos amavam, houve uma onda de indignação que ocupou as manchetes do Correio Popular.
Pois um leitor escreveu aborrecido porque o jornal perdia tanto tempo com uma coisa sem importância como árvores. O prazer em cortar árvores, me parece, está ligado à volúpia do poder. Quem corta, tortura ou mata experimenta o prazer de exercer poder sobre o mais fraco. Mas acho que o prazer em cortar árvores está ligado a uma coisa mais sinistra. Suspeito que estejamos vivendo um momento de metamorfose da nossa condição humana. Até agora temos sido habitantes do mundo da vida. Nosso habitat é constituído por florestas, animais, rios e mares. Somos seres biológicos, corpos. Mas agora estamos mudando de casa. Estamos trocando nossa casa biológica por uma outra casa eletrônica.
Faz tempo fiz a travessia dos lagos andinos - cenários maravilhosos, entre lagos, vulcões e florestas - passando por Bariloche e terminando em Buenos Aires. Em Bariloche fiquei conhecendo um casal que fazia o mesmo percurso com dois filhos adolescentes. Fui reencontrá-los numa das ruas centrais de Buenos Aires. “Graças a Deus estamos aqui!”, me disse o marido. “Já não aguentávamos mais: só lagos, montanhas e árvores. Aqui, felizmente, temos os videogames.” Virei Hulk na mesma hora e lhe disse: “Tomaram a excursão errada. Seu destino era Las Vegas!” Mas eles nada mais fizeram que expressar de forma grosseira o que já ficou normal. Nenhum adolescente troca um vídeo game por jardinagem. Nos filmes de ficção científica do tipo “Guerra nas Estrelas” que emocionam milhões não há árvores: somente máquinas com inteligência eletrônica. Nossas inteligências estão cada vez mais ligadas aos vídeos e computadores e cada vez mais distantes da natureza. Há crianças que nunca viram uma galinha de verdade, nunca sentiram o cheiro de um pinheiro, nunca ouviram o canto do pintassilgo e não têm prazer em brincar com terra. Pensam que terra é sujeira. Não sabem que terra é vida. As nossas escolas - seria bom se elas ensinassem as crianças a amar as árvores. Chamar pelo nome e amar as paineiras, as sibipirunas, as magnólias, os pinheiros, as magueiras, as pitangueiras, os jequitibás, os ipês, as quaresmeiras… Aprendi na escola que os homens são uma forma de vida mais evoluída que as árvores. Estou brincando com a possibilidade do contrário: que as árvores sejam mais evoluídas que nós. Se assim não fosse por que haveriam as Escrituras Sagradas de comparar o homem feliz com uma árvore plantada junto a ribeiros de águas? Com o que concorda Alberto Caeiro: “Sejamos simples e calmos como os regatos e as árvores, e Deus amar-nos-á fazendo de nós belos como as árvores e os regatos…” Deus nos amará quando formos como as árvores!
Ninguém vai para o inferno. Os que não amam as árvores também vão para o céu. Mas, como todos sabem, o céu é o lugar onde se encontram as coisas que amamos. O lugar onde se encontram as coisas que não amamos é o inferno. Assim, para os que não amam as árvores, um lugar com bosques, florestas, flores e riachos seria o inferno. Eles não irão para o inferno de árvores. Irão para o seu céu sem árvores, pois é isso que eles amam.
Morarão numa cidade planejada pelo Niemeyer onde tudo será feito de concreto segundo formas geométricas perfeitas, em nada semelhantes às coisas vivas. Os prédios do Congresso Nacional, em Brasília, são uma metade de esfera voltada para cima e uma metade de esfera voltada para baixo, sem janelas. Na cidade planejada pelo Niemeyer as árvores não sujarão as calçadas com suas folhas e flores. As árvores serão de concreto, semelhantes aos cogumelos: uma esfera cortada pelo meio equilibrando-se sobre um cilindro. O bom disso é que não haverá despesas com jardineiros. E as donas de casa não precisarão varrer a calçada.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Soneto do Depois

Soneto do Depois

Rodolfo Pamplona Filho

Depois de tudo, só resta poesia,
pois o que era temeroso
transformou-se em harmonia;
somente algo poderoso

faz o medo virar segurança,
a tristeza mudar para esperança,
a timidez converter-se em ousadia
e a ansiedade em euforia...

O receio se dissipou,
o universo conspirou
e o desejo se consumou.

Dois corpos se tornaram um
e o universo o lugar comum,
quando só restou o amor...

Salvador, 27 de agosto de 2011.

terça-feira, 24 de abril de 2012

Antropologia.

Antropologia.

Beatriz A.M


Peço licença, à academia, para inaugurar uma nova modalidade de antropologia:
a antropologia de um homem só.

E sobre ela eu produzo um tratado de desejos, conversas e carinhos
de abraços, beijinhos e de canções em dó.

segunda-feira, 23 de abril de 2012

Cotidiano


Cotidiano
Esta é apenas mais uma história baseada em fatos reais...
Jonas pega a sua mochila e cabisbaixo sai. Não sabia se tinha vergonha ou revolta. Sabia que não compreendia aquela situação.
Na noite anterior, sua mulher lhe pedira para não se esquecer de trazer o xarope para a filha, que tossia há quinze dias. Nunca o ar estivera tão seco e a pequena menina sentia muito as alterações do clima. Pudera, com a alimentação que Jonas proporcionava à família... Disse à mulher que só receberia seu salário, consumido pelos vales, em 20 dias, mas pegaria emprestado com algum colega de trabalho. Às 5h, foi para o ponto de ônibus, pois não poderia chegar de novo atrasado.
Márcia era jovem. 17 anos. Mal sabia ler. Criada com os avôs, no sertão, conheceu Jonas, dez anos mais velho, no dia da festa de Santo Antonio, há dois anos. Ele era feio, mas o que fazer naquele fim de mundo. Arrumou-se e um ano depois estava de barriga. Se fosse menina, Severina, nome da avó; nascesse macho, Jonas Jr. Preferia só Junior, mas o pai da criança ficaria contente com o nome.
Ônibus lotado. Jonas não sentia mais nada. Pisavam-lhe os pés; abraçavam-no sem desejo; cotoveladas dos mais baixos, cocurutos dos maiores. Ônibus lotado e aquele calor que desde cedo já entrava em seus ossos. Olhava atônito para a janela do coletivo e as imagens das casas, praças e mangueiras corriam em suas retinas. Olhava, mas não via nada. Um pisão no calo o incomodou, mas permaneceu calado.
No mercado, mandaram-lhe repor a gôndola das bebidas. Vinhos italianos e franceses. Muito cuidado. Pensou em Severina, no momento em que arrumava a última garrafa bonita; escorregou de suas mãos, mas conseguiu pegar. Se a garrafa quebrasse, ficaria sem salário algum. R$135,00 numa garrafa de vinho e ele precisando de R$30,00 para comprar o xarope para o neném. Respirou e ficou lembrando-se de quando fora contratado. Salário-mínimo, descontos de INSS e de vale-transporte. Comida, em quinze minutos, no refeitório do mercado. Só conseguia comer quando serviam vatapá. Era sem sal, sem graça. Todo dia frango com colorau. Só de olhar, perdia a fome.
Passou diante da geladeira dos laticínios. Naquela manhã, chegou a entrega dos queijos e iogurtes vindos de São Paulo. São Paulo era longe; e grande; e tinha muita gente, mas não tinha mais empregos, nem sonhos como d’antes. Os produtos acabavam rapidamente. Manteigas francesas, queijos holandeses, iogurtes de Minas Gerais. Viu a garrafinha de Neston. Abriu e bebeu.
João, o vigia, viu tudo. Na mesma hora foi até o escritório e relatou o furto ao Sr. Walker que lhe perguntou se tinha gravado o crime hediondo. Positivo, disse João. Chame o facínora, disse o patrão. Jonas, cabisbaixo, entrou na sala e confirmou que bebera o líquido ali mesmo, na frente dos clientes e que não iria pagar nada. Ficou com vontade e bebeu. Vá procurar os seus direitos, saia daqui, gritou o patrão. Estava furioso com tanta petulância.
Jonas voltou para casa. Mãe e filha ali não se encontravam. Ficou parado e se deitou. Dormiu e sonhou com um local desconhecido, onde não havia trabalho, nem precisava pagar por aquilo que iria consumir. Não havia doenças ou ônibus. Vazio ou lotado. As casas eram iluminadas pelas sombras das árvores e não havia muros. Os carros andavam bem devagar e tudo era espaçoso e tranquilo. Um rio caudaloso corria por perto e o ar não ficava seco. Acordou com a tosse de Severina. A jovem mulher estava sentada e cabisbaixa. Perguntou o que ele estava fazendo ali, naquela hora. Ele só retornava à noite. A jovem achou estranha a reação dele, que a mandou ir à merda.
O Sr. Andrade passou no mercado e, após fechar a banca do jogo do bicho, comprou três garrafas de um uísque escocês. R$1.200,00. Resolveu comprar pistache e um pouco de queijo brie. Hoje não pagou nenhum prêmio e não teria que pagar a condenação do Manuel, aquela besta que não sabia conferir uma pule. O Dr. Bastos ligara de Brasília, comunicando-lhe que ele ganhou a causa. Depositaria os honorários, R$25.000,00, mas não pagaria nenhum tostão para aquele borra-botas do Manuel. Dez anos trabalhando para mim e só fazendo bobagens. Pagou a conta, em espécie, e foi se divertir na casa da Dinda, como fazia todas as vezes que não pagava ninguém.
Às 15h, o Sr. Walker recebeu um telefonema. Deveria ir para Fort Lauderdale, pois a sua irmã não estava passando bem. Era a única pessoa viva de sua família e ele, com seus 68 anos, não poderia deixá-la só. A querida professora, Miss Daisy, sua irmã, sofria de um mal incurável: rejeição à proteína do leite animal. Naquela manhã, na linda Flórida, sua vizinha amada fizera-lhe um iogurte natural, mas disse-lhe que era de soja. Ela com muita sede bebeu o líquido e sofreu forte alergia. Foi ao hospital, mas logo contaria com a presença de seu irmão, Sr. Walker e tudo terminaria bem.
Jonas acordou no dia seguinte e foi procurar um advogado que lhe disse que iria reverter a justa causa e conseguir uma indenização por danos morais que lhe possibilitaria ganhar o salário de três anos de trabalho. Pediu R$30,00 emprestados para o advogado que lhe disse que estava sem dinheiro naquele momento. Saiu do escritório confiante e conseguiria outro emprego, no mesmo dia. Construção civil, pois ali não haveria geladeira, nem gôndola. Talvez, um banheiro limpo; talvez.
José Antonio
Manaus, 25.8.2011

domingo, 22 de abril de 2012

O Dia

O Dia

Rodolfo Pamplona Filho

É hoje o dia!
E o sangue dá nova pulsada
como um atleta de corrida...
Será que, antes da chegada,
já será despedida?

É hoje o dia!
E a ansiedade
toma todo o corpo,
como se a vontade
aproximasse o porto...

É hoje o dia!
Mas que desespero!
A cada minuto de espera,
tenho um pesadelo
de que serei esquecido na terra...

É hoje o dia!
Tenho a esperança
de que tudo vai dar certo
toda vez que vem a lembrança
de que o momento está perto!

É hoje o dia!
Recebi a confirmação
de que não houve desistência,
o que faz meu coração
renovar sua resistência!

É hoje o dia!
É agora a hora!
Por isso, sem demora,
farei o que sempre quis:
apenas ser feliz.

Salvador, 26 de agosto de 2011.