domingo, 31 de março de 2024

Amor Bastante

 




Paulo Leminski




quando eu vi você

tive uma idéia brilhante

foi como se eu olhasse

de dentro de um diamante

e meu olho ganhasse

mil faces num só instante


basta um instante

e você tem amor bastante


um bom poema

leva anos

cinco jogando bola,

mais cinco estudando sânscrito,

seis carregando pedra,

nove namorando a vizinha,

sete levando porrada,

quatro andando sozinho,

três mudando de cidade,

dez trocando de assunto,

uma eternidade, eu e você,

caminhando junto

sábado, 30 de março de 2024

Um alentejano sozinho...






Rodolfo Pamplona Filho 


Um alentejano sozinho

é mais do que

o desfrute de uma boa bebida:

é a prova inequívoca

de um coração

inquilino da solidão...


Salvador, 08 de março de 2017, uma quarta-feira solitária...⁠⁠⁠⁠

sexta-feira, 29 de março de 2024

Haicai

 



Paulo Leminski


a estrela cadente

me caiu ainda quente

na palma da mão


cortinas de seda

o vento entra

sem pedir licença


 

quinta-feira, 28 de março de 2024

Desejos

 





Rodolfo Pamplona Filho 


Quero alguém

para junto envelhecer,

mas não quero

ficar velho.


Quero alguém

para me amarrar,

mas não quero

perder minha liberdade.


Quero alguém

para realizar o sonho

de viver

uma nova realidade.


Cusco, 13 de abril de 2017.  

quarta-feira, 27 de março de 2024

Distâncias Mínimas


 



Paulo Leminski



um texto morcego

se guia por ecos

um texto texto cego

um eco anti anti anti antigo

um grito na parede rede rede

volta verde verde verde

com mim com com consigo

ouvir é ver se se se se se

terça-feira, 26 de março de 2024

Incompletudes e Idiossincrasias





Rodolfo Pamplona Filho 


Mulher sem ciúme

Homem sem barriga

Criança sem sorriso

Festa sem bebida

Férias sem viagem

Casamento sem DR

Menstruação sem TPM

Emprego sem patrão

Trabalho sem produção

Poeta sem musa

Poesia sem inspiração

Alegria sem você


Cusco, 15 de abril de 2017       

segunda-feira, 25 de março de 2024

Maltratado

 





Rodolfo Pamplona Filho


Apanhar quando se espera carinho

Ser acusado quando se queria um beijo

Explicar o que já foi entendido

Desculpar-se pelo que não fez

Um choro calado

pela surpresa da reação

Uma tristeza profunda

pela incompreensão

Uma saudade incontida

de um simples abraço

Uma lembrança bendita

de que ainda existe esperança.


Cusco, 15 de abril de 2017.

domingo, 24 de março de 2024

sábado, 23 de março de 2024

As Dificuldades da Vida






Rodolfo Pamplona Filho 


É impressionante

como, para algumas pessoas,

tudo flui naturalmente,

enquanto, para outra gente,

é um parto de elefante:

algo definitivamente anormal

fazer algo que soa

entre o banal

e o sensacional.


Cusco, 11 de abril de 2017.     

sexta-feira, 22 de março de 2024

Eu




 Paulo Leminski


eu

quando olho nos olhos

sei quando uma pessoa

está por dentro

ou está por fora


quem está por fora

não segura

um olhar que demora


de dentro de meu centro

este poema me olha

 

quinta-feira, 21 de março de 2024

Lugar de fala





Rodolfo Pamplona Filho 


É preciso mesmo

ter sentido na pele

para sustentar

um posicionamento?

É necessário

passar o dissabor

para defender

o sofredor?


Será que a empatia

não libera a poesia

de se sentir irmanado

a quem sofreu o atentado?

Será que a fraternidade

não é aceitável

como esforço da humanidade

para reparar o irreparável?


O ideal do lugar de fala

é ser lugar de quem não se cala,

e que, mesmo não tendo sofrido a dor,

sabe reconhecer o seu valor

Se é certo que traz legitimidade

ao apresentar sua verdade,

exigir sua aplicabilidade

como única verdade

também pode se tornar

um mecanismo de exclusão,

em uma profunda distorção

de uma boa e sincera intenção.


Salvador, 18 de março de 2017, terminada em Machu Picchu, 14 de abril de 2017.      

quarta-feira, 20 de março de 2024

Bem no Fundo





 Paulo Leminski



No fundo, no fundo,

bem lá no fundo,

a gente gostaria

de ver nossos problemas

resolvidos por decreto


a partir desta data,

aquela mágoa sem remédio

é considerada nula

e sobre ela — silêncio perpétuo


extinto por lei todo o remorso,

maldito seja que olhas pra trás,

lá pra trás não há nada,

e nada mais


mas problemas não se resolvem,

problemas têm família grande,

e aos domingos saem todos a passear

o problema, sua senhora

e outros pequenos probleminhas.

terça-feira, 19 de março de 2024

Enduro

 




Quero escalar você lentamente,

conhecendo cada atalho ou curva,

subindo suas escarpas com firmeza

até alcançar o seu cume...

Desbravar suas corredeiras,

penetrar em suas cavernas,

deslizar em suas encostas

e me pendurar em seus vales.

Passear de tirolesa em seus encantos

Mergulhar em suas cascatas

Subir ao seu pico nevado

e descer até a sua base

Descobrir a nascente de seus rios

e conhecer seus afluentes

Explorar toda a sua extensão

até conquistar seu coração.


No caminho para Machu Picchu, 14 de abril de 2017.

segunda-feira, 18 de março de 2024

Apagar-me




 Paulo Leminski



Apagar-me

diluir-me

desmanchar-me

até que depois

de mim

de nós

de tudo

não reste mais

que o charme.

domingo, 17 de março de 2024

Presente de Olhos Verdes

 



 Rodolfo Pamplona Filho


Durante longo tempo,

busquei encontrar

um novo alento

para descansar

 

Nas minhas andanças,

sempre a lutar,

sofri tanto que cheguei

a desistir de sonhar

 

Mas, um dia,

tudo mudou:

uma pequena menina me ensinou

o que é o amor…

 

No renovar das esperanças,

se um evento pede lembranças,

minha vida é uma festa em redes

e você é meu presente de olhos verdes…

 

Belo Horizonte, 24 de fevereiro de 2024.


sábado, 16 de março de 2024

Por mais estrelas ...

 





Mihai Eminescu



Por mais estrelas que ardam nas alturas,

Por mais ondas que vaguem sobre o mar,

Dessa luz, de seus brilhos e lonjuras

Ninguém sabe – nem nada há de ficar.


Tu podes, pois, seguir o teu caminho:

Sejas bom, ou de crimes instrumento –

É o mesmo pó, abismo e remoinho!

Tua herança de tudo – o Esquecimento!


Parece-me que morro: junto à porta

Esperam os que querem me enterrar;

Ouço cantos e vejo uma luz morta.


Ó sombra doce, vem mais perto, a dar

Sobre mim este adejo que transporta

Da Morte a asa negra, úmido olhar.



Tradução: Luciano Maia

sexta-feira, 15 de março de 2024

Perdendo-se

 


Rodolfo Pamplona Filho

 

Primeiro se perde a paixão

Depois a confiança

Depois o tesão

Depois a esperança

Depois não sobra mais nada

 

Salvador, 27 de fevereiro de 2024.

quinta-feira, 14 de março de 2024

Quando até a voz...

 



Mihai Eminescu


Quando até a voz do pensamento cala,

Me envolve o doce canto de uma prece –

Então te chamo; o meu chamar te abala?

Sairás da fria bruma que te tece?


E a escuridão da noite aclararás

Com teu olhar pacífico e risonho?

Retorna, deixa as sombras para trás,

Para te ver voltar – como num sonho!


Vem lentamente... perto... ainda mais;

Chega sorrindo junto à minha face,

Mostra-me, num suspiro, que és tornada.


Que teu cílios nos meus façam-se laços,

Para que eu sinta um frêmito nos braços –

Para sempre perdida e sempre amada!



Tradução: Luciano Maia


quarta-feira, 13 de março de 2024

Urticária Nervosa

 


 

Rodolfo Pamplona Filho


Nunca pensei

que o stress

pudesse fazer

meu corpo sentir

o reflexo do caos

que habita minha mente

 

Nunca sonhei

que a dor da alma

virasse física

e se convertesse

em agonia constante

na minha própria pele

 

Nunca desejei

tanto a libertação

de uma relação

outro gostosa,

mas que só me causou

urticária nervosa.

 

Salvador, 26 de fevereiro de 2024.


terça-feira, 12 de março de 2024

São muitos anos ...

 



Mihai Eminescu


São muitos anos e outros vão passar

Desde a hora santa em que nos encontramos,

Mas lembro sempre o quanto nos amamos,

Gélidas mãos e grande ardor no olhar.


Ó, vem palavras doces me inspirar,

Teu rosto sobre mim deita e me mira:

Sob sua luz me deixa ainda sonhar,

Novas canções arranca à minha lira!


Tu nem o sabes - ao te aproximares,

Meu coração no fundo já se acalma

Qual o surgir da estrela sobre os mares;


Quando sorris, criança, és minha calma,

Se extingue, então, a vida de pesares,

O olhar me arde e me transborda a alma!



Tradução: Luciano Maia

 

segunda-feira, 11 de março de 2024

Mandrião Estouvado

 



 Rodolfo Pamplona Filho


Eu sempre acreditei

que o trabalho emancipa

Eu sempre defendi

a importância da gentileza

Eu sempre pensei

que eu fosse visivelmente delicado

Eu sempre lutei

para prestar um serviço com cuidado

Eu sempre busquei

ser visto como alguém dedicado

Eu sempre achei

que todos me achavam bem educado

Mas, lá no fundo,

Eu não passo de um mandrião estouvado.

 

Salvador, 26 de fevereiro de 2024.

domingo, 10 de março de 2024

A lenda da Tília

 







Mihai Eminescu


-“Branca, sabes que de amor

sem lei nasceste, mas isto

fez-me jurar desde então

que esposarás Jesus Cristo!


Vestindo o hábito de monja,

Indo a um mundo mais sublime,

Redimirás tua mãe,

Me libertarás de um crime.”


-“Deste mundo, caro pai,

quem quiser dele se mude;

a minh’alma é tão alegre,

radiosa a juventude!


A dança, a música, o bosque,

Isto é o que minh’alma preza;

Não um catre solitário

Onde chorando se reza!”




-“Sei o que melhor te serve,

como eu disse assim será;

À viagem de amanhã,

Te prepara desde já!”


Mãos aos olhos leva Branca,

Tudo em sua mente se aduna;

A cabeça ardendo, louca...

Só lhe resta esta fortuna?


Seu cavalo branco, amigo,

Selado lá fora, espera;

Ela põe o pé no estribo,

Ir ao bosque delibera.


A noite vem do arvoredo

Cujo perfume a embevece;

O céu as estrelas mostra,

Doce anúncio se oferece.




Ela nos bosques penetra

Até a velha tília, onde,

Com flores que vêm ao solo,

Fonte mágica se esconde.


Embalada à voz das águas,

Canta a trompa, um som incerto.

Forte... cada vez mais forte...

Perto... cada vez mais perto...


E a fonte, presa em magia,

Brotando, um rumor espraia –

Sobre os bosques das colinas,

Lua branda de atalaia.


Como em sonho, Ela delira

E ao olhar, pasma, ao seu lado,

Vê um garboso mancebo

Em corcel negro montado...


Será que os olhos lhe mentem?

Ou será verdade pura?

Flores de tília ao cabelo,

Trompa de prata à cintura.


Ela então os olhos baixa,

Passa a mão na fronte e um gozo

O seu coração lhe inunda

De um encanto doloroso.


Ele se chega mais perto,

Infantil e suplicante;

Dela a alma se inebria,

Cerra os olhos, neste instante.


Com uma mão tenta afastá-lo,

Mas sente presos seus braços

De uma dor, de uma doçura

No seu peito em fortes laços.


Gritaria... mas não ousa,

Sua fronte cai-lhe ao ombro;

Seus beijos sem conta a boca

Dele sorve, em desassombro.



Carinhoso, ele a interroga

Mas ela a face lhe esconde.

E com voz doce, baixinho,

Pouco a pouco lhe responde.

..................................................

Vão juntos, em cavalgada,

A ninguém ouvidos dando,

E no amor, vão um ao outro

Nos olhos se devorando.


E sempre vão mais além

Por sombras, de vale em vale;

E a melancólica trompa

Soa doce, soa grave.


O seu brando som se espalha

Pelos vales ressoante,

Mais suave... mais suave...

Mais distante... mais distante...


Sobre os pinhos das colinas

Segue a lua de atalaia.

E a fonte, presa em magia,

Brotando, um rumor espraia.


 


Tradução: Luciano Maia


sábado, 9 de março de 2024

Decepções

 


Rodolfo Pamplona Filho


Não há decepção,

por maior que seja,

que não possa ser ampliada

 

Toda vez que eu acho difícil

ou que algo está ruim,

ainda é possível deixar pior

 

Você faz isso

de propósito

para testar os meus limites?

 

Sempre sem querer

Sempre sem saber

Sempre sem entender

Mais um caso isolado

que acontece muito

e sempre.

Sempre é,

sempre foi

e sempre será.

 

Salvador, 26 de fevereiro de 2024.

sexta-feira, 8 de março de 2024

Tão delicada...

 



Mihai Eminescu



Tão delicada, és semelhante

À alva flor da cerejeira.

E como um anjo entre os mortais

Surges da minha vida à beira.


Nem bem tu tocas o tapete,

A seda soa ao teu pisar

E da cabeça até os pés

Pairas num sonho, a flutuar.


Das dobras longas do vestido,

Como do mármore, ressais,

Presa a minh’alma aos olhos teus

Cheios de lágrimas e ais.


Ó sonho meu feliz de amor,

Noiva suave, de outras lendas,

Não me sorrias! Se sorrires

Tua doçura me desvendas.


Podes, no encanto da tua noite,

Deixar-me os olhos sempre baços

E com o murmúrio de tua boca

No frio enredo dos teus braços.




Súbito, passa um pensamento

No véu do teu ardente olhar:

É a renúncia penumbrosa,

Sombra de doce suspirar.


Te vais e eu bem compreendi

Não mais deter o passo teu;

Perdida, sempre, para mim,

Noiva imortal no peito meu!


Pois ter-te visto é culpa minha,

Da qual jamais terei perdão;

Expiarei sonho de luz

A mão direita erguendo, em vão.


Ressurgirás como uma aura

Da eterna virgem, de Maria,

Em tua fronte uma coroa...

Aonde tu vais? Voltas um dia?


 


 


Tradução: Luciano Maia

quinta-feira, 7 de março de 2024

Confissão de Toxicidade

 


Rodolfo Pamplona Filho

 

Eu devo ser tóxico

Eu devo despertar o pior em você

Como alguém pode ser tão legal com todo mundo menos comigo?

Como alguém pode ser tão legal com todo mundo menos com você?

Confissão de Toxicidade: meu coração virou um poço amargo de fel…

 

Salvador, 27 de fevereiro de 2024.

terça-feira, 5 de março de 2024

Funcionamento

 



Rodolfo Pamplona Filho






Sua mente é um aparelho

em constante busca

de soluções

para qualquer tipo

de problema:

na ausência

de um desafio,

ela se introverte

e entra em modo avião.


Seu cérebro é um processador

mais rápido do que

qualquer computador,

em que todo questionamento

automaticamente

é respondido,

antes que o interlocutor

termine o raciocínio.


Suas atitudes são reflexos

de anos de condicionamento,

em que a lógica

não excluiu a emoção,

mas a separou

em caixas diferentes

para não haver confusão.


Seu coração é um dínamo

que se alimenta de carinho

e deseja retribuir,

como o óleo e o combustível

que renovam e fazem funcionar

todo o sistema.


Ele parece uma máquina

e há quem ache que seja mesmo,

mas, no final das contas,

ele é apenas

o que Nietzsche vaticinou:

humano, demasiadamente humano,

a ponto de ser tão diferente

que a humanidade não lhe reconhece...


São Paulo, 16 de novembro de 2019.

segunda-feira, 4 de março de 2024

Amor Bastante




 Paulo Leminski


quando eu vi você

tive uma idéia brilhante

foi como se eu olhasse

de dentro de um diamante

e meu olho ganhasse

mil faces num só instante


basta um instante

e você tem amor bastante


um bom poema

leva anos

cinco jogando bola,

mais cinco estudando sânscrito,

seis carregando pedra,

nove namorando a vizinha,

sete levando porrada,

quatro andando sozinho,

três mudando de cidade,

dez trocando de assunto,

uma eternidade, eu e você,

caminhando junto


domingo, 3 de março de 2024

A Precisão da Adolescência

 



Rodolfo Pamplona Filho




Pode ser

Não sei

Tanto faz

Legal, mas não é minha praia

É isso aí!


Morro de São Paulo, 01 de janeiro de 2020.

sábado, 2 de março de 2024

Haicai

 



Paulo Leminski



a estrela cadente

me caiu ainda quente

na palma da mão


cortinas de seda

o vento entra

sem pedir licença


sexta-feira, 1 de março de 2024

Adolescente

 




Rodolfo Pamplona Filho


 

E aí?

Mano

Top

De boa

Se ligue

Man

Véi 

Baratino

Barril

Sipá 

Sepa

Pala

Paia 

Partiu


Morro de São Paulo, 02 de janeiro de 2020.