segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

A parte ré amaldiçoada pelo juiz


A parte ré amaldiçoada pelo juiz (03.06.11)

Na comarca de uma vara só, há um saudável hábito de fraterna convivência entre os operadores do Direito. Nos finais das tardes de sextas-feiras, advogados, juiz, promotor e alguns servidores forenses se reúnem no clube local para a prática de vôlei ou futebol.

Tradicionalmente o magistrado é jogador; o representante do M.P. prefere atuar de apito à boca.

Numa dessas sextas-feiras, o jogo teve que ser interrompido, ante a presença - engravatado - de um brilhante advogado que, apresentando a petição inicial de uma medida cautelar, buscava a decisão liminar do juiz.

O magistrado leu e despachou ali mesmo, de próprio punho, autorizando o escrivão - que ficara no foro - "às diligências posteriores e imediatas". 

A incumbência da autuação e a expedição de mandado etc  foram delegadas pelo serventuário a uma novel estagiária forense, cedida uma semana antes pela Prefeitura. O escrivão assinou, "por ordem do doutor juiz", um oficial de justiça foi convocado, o mandado foi cumprido etc etc.

Na segunda-feira o réu apresentou-se num dos tradicionais escritórios de Advocacia da cidade, brandindo com o mandado de citação na mão.

- Eu aceito ser réu, aceito também a liminar contra mim, mas não aceito ser amaldiçoado pelo juiz - vociferou o cliente.

O advogado ponderou que "o juiz é uma pessoa respeitosa, que não amaldiçoa ninguém"...

Dito isso, o profissional da Advocacia passou a examinar o mandado e leu, incrédulo: (...) "Diante disso, defiro a medida cautelar, ante a maldita outra parte" etc.

O advogado do réu foi ao foro, conversou com o magistrado (é um desses que está sempre disposto a receber partes e procuradores), e então esclareceu-se que o texto original da decisão inicial manuscrita referia "diante disso defiro a medida cautelar ´inaudita altera pars´".

A estagiária foi chamada. O juiz explicou-lhe a expressão latina, ela justificou-se que era novata, mas fez duas ponderações. Primeira: a caligrafia do magistrado não era fácil; segunda: a culpa final fora do escrivão, que assinara o mandado sem conferir.

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Ao final, alguns meses depois a ação foi julgada improcedente, sabe-se lá porque...
FONTE: Espaço Vital

Charge de Gerson Kauer

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