Excelentíssimo Senhor Advogado Eurípedes Brito Cunha, DD Presidente Empossado do Instituto Baiano de Direito do Trabalho
Excelentíssima Senhora Juíza Maria de Fátima Coelho Borges Stern, DD Presidente da Associação dos Magistrados do Trabalho da 5ª Região
Excelentíssimo Senhor Professor Adroaldo Leão, MD Coordenador do Curso de Direito da UNIFACS – Universidade Salvador
Senhores magistrados, procuradores, advogados, parentes, alunos e amigos
Senhoras e Senhores
Convocado fui para uma nobilíssima tarefa: fazer um discurso, não de homenagem, mas de lembrança e saudade, de um dos mais gentis seres humanos que já conheci em minha vida.
E essa qualificação, definitivamente, não é um exagero ou arroubo de retórica, pois desafio publicamente a quem, aqui presente, possa se lembrar de alguém tão cordato e agradável como o magistrado e eterno (e essencialmente) Professor Antônio Carlos Araújo de Oliveira.
Seu passamento, em 06 de novembro de 2004, deixou um enorme vazio em nosso meio jurídico que somente o tempo, senhor de toda a Razão e cicatrizador de toda ferida, poderá preencher e restaurar, pois a lacuna, que fica nos recônditos de emoção, jamais será apagada.
Falar, portanto, em nome do IBDT, da Amatra-V e do Curso de Direito da UNIFACS, por delegação de seus representantes, sobre uma figura tão iluminada é mais do que uma honra: é a oportunidade de tentar manifestar em palavras aquilo que somente a perfeição dos sentimentos pode transmitir.
Antônio Carlos de Oliveira era e é, para mim e para uma imensa quantidade de pessoas aqui presentes, mais do que um notável jurista: era o terno e eterno professor; era o colega “pau para toda obra”, que nunca recusava uma missão e sempre as cumpria com galhardia e precisão; era o amigo pai e o amigo irmão, que todos elegiam pelo coração...
Um discurso de tal importância poderia, portanto, ser feito de várias formas: mostrando toda a titulação daquele a quem se lembra; descrevendo o porque se deve homenageá-lo; ou, então, simplesmente trazendo as impressões pessoais do orador sobre a quem se reverencia a memória.
Seguindo, porém, o mesmo modelo que fiz, quando o saudei em sua posse na Academia Nacional de Direito do Trabalho, permito-me condensá-las para, em vez de fazer um discurso impessoal como o desfiar de itens de um currículo, apresentar um testemunho vivo sobre a ímpar pessoa que jamais será esquecida.
E faço isso pela consciência de que minha escolha como orador não é fruto somente de meus eventuais méritos de eloqüência, mas sim muito mais pela circunstância de que a nossa amizade foi também um dos maiores legados deixados por meu pai, que a prezava sobremaneira.
Lembro-me quando nos vimos pela primeira vez.
Contava eu dezoito anos de idade, recém aprovado no vestibular de Direito da Universidade Federal da Bahia, e Antonio Carlos tinha sido recentemente designado vice-Diretor da Faculdade, estando no exercício da Diretoria.
“Venha conhecer um grande professor”, disse meu pai, apresentando-me, muito antes da primeira matrícula, aquele que veio a ser meu primeiro professor, e depois, meu amigo, meu colega e meu confrade.
Uma história de amizade que ultrapassa gerações tem de ser contada com muito carinho e com um cuidado de ourives, pois tal sentimento merece ser lapidado tanto com a mente, quanto com o coração, para que possa ostentar toda a beleza que carrega em seu íntimo.
Comecemos com a mente, cumprindo obedientemente o tradicional rito.
Nascido Antonio Carlos Araújo de Oliveira, em Alagoinhas, no estado da Bahia, muda-se em tenra idade, com sua família, para Salvador, onde é matriculado no Liceu Salesiano, completando a sua formação primária e iniciando o ginásio.
Transferindo-se para o Colégio Central da Bahia, berço da nata da intelectualidade baiana, completa o curso ginasial e o clássico, sendo aprovado no vestibular para a Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia, pela qual se vem a graduar em 1957.
No ano seguinte, ocorre um dos momentos mais importantes de sua vida, o casamento, em 25 de janeiro, com a meiga Therezinha, com quem teve cinco filhos, vários netos, um bisneto e muitos anos de felicidade contínua... Lembro-me do aniversário de 45 (quarenta e cinco) anos de casado, que tive privilégio de presenciar, em que os dois exalavam a felicidade de dois jovens namorados, como um exemplo a qualquer pessoa que um dia queria ser feliz no amor...
Na vida profissional, militou como advogado por dez anos, tendo dedicado treze anos de serviço público ao antigo Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Comerciários.
Em 1967, foi nomeado Juiz do Trabalho Substituto, após aprovação em concurso público de provas e títulos, sendo promovido a Juiz Presidente da Junta de Conciliação e Julgamento de Maruim, em Sergipe, em 1970, onde permanece até 1978, quando é removido, a pedido, para a 2ª JCJ de Simões Filho e, logo depois, para a 6ª JCJ de Salvador, aposentando-se, por tempo de serviço, em 02/09/1982.
* Convidado pelo Juiz Hylo Gurgel, à época Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região, assume o cargo de Diretor Geral do TRT, que exercerá por quase quatro anos, inclusive nas gestões dos magistrados Washington Luiz da Trindade e Alfredo Vieira Lima.
Nesta Corte de Justiça especializada, também atuou rapidamente como assessor de juiz, exercendo, ainda, o encargo de Coordenador de Cursos e Eventos do Centro de Preparação e Aperfeiçoamento da Magistratura Trabalhista da 5ª Região (CEMAG) e da Escola de Preparação e Aperfeiçoamento da Magistratura Trabalhista da 5ª Região (EMATRA).
Além disso, sempre foi um atuante membro do Instituto Baiano de Direito do Trabalho, do qual foi Presidente, sucedido pela gestão que hoje se inicia, dirigindo a Revista ERGON com maestria.
Sua grande vocação, porém, foi, sem qualquer dúvida, a atividade acadêmica.
Com efeito, concluindo o Curso de Doutorado em Direito Privado, em 1965, pela UFBA, e o “Curso de Formação de Professores” do ensino Técnico Comercial, promovido pelo MEC, em 1966, logo busca a realização de seu talento no magistério.
Em 1968, ingressa como Professor Titular da Faculdade de Ciências Contábeis da Fundação Visconde de Cairú, lecionando Direito e suas Instituições, Direito do Trabalho e Direito Previdenciário, matéria em que é a maior autoridade baiana até a atualidade.
Em 1970, ingressa na casa comum a todos nós, a UFBA, como Auxiliar de Ensino, em prova de títulos, passando a Professor Assistente em 1977 - em memorável concurso público que contou, na banca, com os Professores José Martins Catharino, Octavio Bueno Magano e Messias Pereira Donato – sendo promovido a Adjunto, em 1983.
Ali, lecionou diversas disciplinas, como todas as cadeiras de Introdução ao Estudo do Direito, Direito do Trabalho e Direito Previdenciário, além de, eventualmente, outras matérias que lhe fossem designadas por necessidade do Corpo Discente.
Foi nomeado Coordenador do Curso de Graduação em 1984, exercendo tal cargo por dois biênios consecutivos, Vice-Diretor em 1990 e Diretor em 1992, encabeçando lista sêxtupla como o mais votado pelos professores, funcionários e estudantes, tendo eu mesmo sido seu “cabo eleitoral” na época.
Mesmo tendo se aposentado da graduação em 1997, continuou a ministrar aulas na Fundação Faculdade de Direito da Bahia, coordenando o Curso de Especialização em Direito do Trabalho.
Atuou em várias outras instituições de Ensino, valendo destacar a sua coordenação de cursos na Escola Superior de Advocacia Orlando Gomes e no Curso de Direito da Faculdade Integrada da Bahia.
Pontificou, desde 1999, na Universidade Salvador-UNIFACS, como seu Professor de Introdução ao Estudo do Direito e Direito Previdenciário, tendo coordenado, inclusive, o Grupo de Pesquisa sobre os Juizados Especiais no Estado da Bahia, cujos resultados recentemente foram transformados em livro.
A imortalidade formal lhe foi outorgada pela Academia de Letras Jurídicas da Bahia, desde 1994, tendo exercido dinamicamente diversos cargos em suas Diretorias até ascender ao cargo de Presidente, bem como na Academia Nacional de Direito do Trabalho, desde 2002, quando, eleito em disputada votação, convidou-me para saúda-lo em sua posse.
Como se não bastasse, pertenceu a várias outras entidades culturais, como, a título exemplificativo, o Instituto Sergipano de Direito do Trabalho e Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário, associações das quais é, inclusive membro fundador.
Colaborou com mais de dez revistas técnicas nacionais, tendo publicado nove livros, sem contar colaborações em obras coletivas, em coordenação própria ou alheia.
Participou ativamente de eventos culturais, sendo dignitário de diversas distinções universitárias, como paraninfias e eleições como “amigo da turma”, bem como honrarias oficiais, a saber, a Comenda do Mérito Judiciário do Trabalho do TST, a Comenda da Ordem Sergipana do Mérito Trabalhista do TRT da 20ª Região e a Medalha do Mérito Judiciário da AMATRA-V.
São tantos predicados que poderia me perder na sua enumeração nesse discurso.
Todavia, vencida a fase histórico-protocolar, é hora de dar espaço novamente ao coração.
Ao rascunhar estas linhas, pensei em um título para este discurso.
A primeira idéia era mencionar que se tratava de uma elegia, um poema lírico de tom geralmente terno e triste.
Esta manifestação, porém, deveria ser diferenciada, pois o sujeito que a inspirava era e é um símbolo para várias gerações: um parâmetro de ética e de conduta profissional que, lamentavelmente, cada dia se torna mais raro.
Já declarei várias vezes – inclusive sob a audiência de muitos aqui presentes – que, se todas as pessoas têm desafetos, o Prof. Antonio Carlos pode ser considerado uma “barema de personalidade”, um instrumento de medição de caráter, pois se há alguém nesta vida que lhe possa não ter admiração, boa figura certamente não é.
Trata-se do indivíduo mais doce que conheci no meio intelectual. Nunca vi um testemunho sequer de exaltação ou descortesia com quem quer que seja.
Se, após o falecimento, é muito comum a hipocrisia fazer com que os que já não estão entre nós sejam considerados unanimidades, isto não se aplica a Antonio Carlos: de fato, ele já era unanimidade muito antes de nos deixar...
Por isso, deixei de nomear esse discurso de “Elegia para um Homem de Bem”, pois isso é muito pouco para revelar a admiração de todos aqui presentes. Nomeio-o “Elegia para um Homem DO Bem”, pois poucas pessoas, no nosso meio, incorporaram tão bem o sentimento da bondade no seu testemunho do dia-a-dia.
Permitam-me, para encerrar, uma nota mais pessoal ainda: quando meu pai faleceu, alguns grandes amigos e professores adotaram-me afetivamente de uma forma muito carinhosa. Antonio Carlos de Oliveira era um deles. Sinto-me, portanto, novamente órfão, com o doloroso sentimento que só um esforço hercúleo da razão permite sobrepujar: saudade, muita saudade...
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