sábado, 28 de outubro de 2023

Debate?





Todo afirmação peremptória, 

que não admite a possibilidade 

de eventualmente estar errada, 

é manifestação de intolerância.

Ou simplesmente de burrice...




Abrantes, 27 de março de 2016.

sexta-feira, 27 de outubro de 2023

quinta-feira, 26 de outubro de 2023

As pequenas coisas irritantes da vida...





Há coisas pequenas que estragam 

meu dia, meu humor, minha paz

Se soam como cães ladrando,

atingem-me como facada nas costas,

pois chegam quando menos se espera

e se originam de onde sequer

poderia eu imaginar...

Se a memória é um dom,

pode ser também uma maldição,

se gera o vício

na dependência difícil 

do gosto do fel...

Quando começo a remoer, 

preciso de algum tempo para assentar

e conseguir superar 

a frustração 

a decepção 

a desilusão 

e tudo mais que rima com ão...

pois condenado estou

a não ter mais salvação...



Salvador, 19 de dezembro de 2015, profundamente chateado com a pequenez de quem julga e condena sem responsabilidade...

quarta-feira, 25 de outubro de 2023

XXVIII - Li Hoje




 Alberto Caeiro

 


 

 

     Li hoje quase duas páginas

     Do livro dum poeta místico,

     E ri como quem tem chorado muito.

     Os poetas místicos são filósofos doentes, 

     E os filósofos são homens doidos.


     Porque os poetas místicos dizem que as flores sentem 

     E dizem que as pedras têm alma

     E que os rios têm êxtases ao luar.


     Mas flores, se sentissem, não eram flores, 

     Eram gente;

     E se as pedras tivessem alma, eram cousas vivas, não eram pedras;

     E se os rios tivessem êxtases ao luar,

     Os rios seriam homens doentes.


     É preciso não saber o que são flores e pedras e rios 

     Para falar dos sentimentos deles.

     Falar da alma das pedras, das flores, dos rios,

     É falar de si próprio e dos seus falsos pensamentos.  

     Graças a Deus que as pedras são só pedras, 

     E que os rios não são senão rios,

     E que as flores são apenas flores.


     Por mim, escrevo a prosa dos meus versos 

     E fico contente,

     Porque sei que compreendo a Natureza por fora;

     E não a compreendo por dentro

     Porque a Natureza não tem dentro;

     Senão não era a Natureza.


terça-feira, 24 de outubro de 2023

Diretiva da Vergonha

 




Fui detido

- não acredito! –

Em um Campo de Concentração,

Digo, um Centro de Detenção


Fui detido

Sem crime cometer

Sem matar, nem roubar

Ou a ninguém prejudicar


Fui detido

Sem direito de defesa

Como se estar sem documento

Fosse um bilhete direto para o inferno


Fui detido

Pelo crime de ter esperança

De buscar um novo horizonte

Para mim e minha família


Fui detido

Pelo pecado de sonhar

Por uma nova vida enfrentar

Com disposição para trabalhar


Diretiva

Diretriz

Direção

Que eu não quis...


Retorno

Resolvo

Revolto

Expulsão...


Ilegais são atos, não pessoas.

Indignos são preconceitos escondidos

Em um revival de tempos idos

Em que se separava as pessoas pela origem


Fui detido

- é certo! –

Não pelo que fiz ou faria

Mas pelo crime de SER HUMANO


Ciudad Real, 28 de setembro de 2009

segunda-feira, 23 de outubro de 2023

Lisboa

 



Álvaro de Campos

 


 

    Lisboa com suas casas 

    De várias cores, 

    Lisboa com suas casas 

    De várias cores, 

    Lisboa com suas casas 

    De várias cores ... 

    À força de diferente, isto é monótono. 

    Como à força de sentir, fico só a pensar. 

    Se, de noite, deitado mas desperto, 

    Na lucidez inútil de não poder dormir, 

    Quero imaginar qualquer coisa 

    E surge sempre outra (porque há sono, 

    E, porque há sono, um bocado de sonho), 

    Quero alongar a vista com que imagino 

    Por grandes palmares fantásticos, 

    Mas não vejo mais, 

    Contra uma espécie de lado de dentro de pálpebras, 

    Que Lisboa com suas casas 

    De várias cores. 


    Sorrio, porque, aqui, deitado, é outra coisa. 

    A força de monótono, é diferente. 

    E, à força de ser eu, durmo e esqueço que existo. 


    Fica só, sem mim, que esqueci porque durmo, 

    Lisboa com suas casas 

    De várias cores.


domingo, 22 de outubro de 2023

Pontualidade

 





Achar natural

que outros esperem,

ainda que alguns segundos,

fazer algo que

só interessa a você

é o cúmulo da cara-de-pau

com a falta de noção...

E o pior de tudo

é quando se pede

que tenham consciência

para respeitar

o que só lhe interessa,

seja o embarque

(ou desembarque)

de alguém

ou mesmo

que algo ocorra

como se fosse

a mais importante

de todo o universo.

Como não se irritar

com as desculpas

ou justificativas

para seu atraso?

Ver rostos contritos,

olhos de gato de botas

ou um ar indignado

de quem foi vítima,

e não a causa

do irritante atraso

que prejudica todo mundo,

até mesmo a si...

E quem ousa reclamar,

deixando o silêncio conveniente,

para ser descrito

como um sujeito paranóico,

estressado ou simplesmente chato,

que fica inventando caso

ou querendo aparecer...

Pontualidade é respeito

ao tempo alheio!

E ponto!


Atenas, 29 de setembro de 2012.