sábado, 16 de março de 2024

Por mais estrelas ...

 





Mihai Eminescu



Por mais estrelas que ardam nas alturas,

Por mais ondas que vaguem sobre o mar,

Dessa luz, de seus brilhos e lonjuras

Ninguém sabe – nem nada há de ficar.


Tu podes, pois, seguir o teu caminho:

Sejas bom, ou de crimes instrumento –

É o mesmo pó, abismo e remoinho!

Tua herança de tudo – o Esquecimento!


Parece-me que morro: junto à porta

Esperam os que querem me enterrar;

Ouço cantos e vejo uma luz morta.


Ó sombra doce, vem mais perto, a dar

Sobre mim este adejo que transporta

Da Morte a asa negra, úmido olhar.



Tradução: Luciano Maia

sexta-feira, 15 de março de 2024

Perdendo-se

 


Rodolfo Pamplona Filho

 

Primeiro se perde a paixão

Depois a confiança

Depois o tesão

Depois a esperança

Depois não sobra mais nada

 

Salvador, 27 de fevereiro de 2024.

quinta-feira, 14 de março de 2024

Quando até a voz...

 



Mihai Eminescu


Quando até a voz do pensamento cala,

Me envolve o doce canto de uma prece –

Então te chamo; o meu chamar te abala?

Sairás da fria bruma que te tece?


E a escuridão da noite aclararás

Com teu olhar pacífico e risonho?

Retorna, deixa as sombras para trás,

Para te ver voltar – como num sonho!


Vem lentamente... perto... ainda mais;

Chega sorrindo junto à minha face,

Mostra-me, num suspiro, que és tornada.


Que teu cílios nos meus façam-se laços,

Para que eu sinta um frêmito nos braços –

Para sempre perdida e sempre amada!



Tradução: Luciano Maia


quarta-feira, 13 de março de 2024

Urticária Nervosa

 


 

Rodolfo Pamplona Filho


Nunca pensei

que o stress

pudesse fazer

meu corpo sentir

o reflexo do caos

que habita minha mente

 

Nunca sonhei

que a dor da alma

virasse física

e se convertesse

em agonia constante

na minha própria pele

 

Nunca desejei

tanto a libertação

de uma relação

outro gostosa,

mas que só me causou

urticária nervosa.

 

Salvador, 26 de fevereiro de 2024.


terça-feira, 12 de março de 2024

São muitos anos ...

 



Mihai Eminescu


São muitos anos e outros vão passar

Desde a hora santa em que nos encontramos,

Mas lembro sempre o quanto nos amamos,

Gélidas mãos e grande ardor no olhar.


Ó, vem palavras doces me inspirar,

Teu rosto sobre mim deita e me mira:

Sob sua luz me deixa ainda sonhar,

Novas canções arranca à minha lira!


Tu nem o sabes - ao te aproximares,

Meu coração no fundo já se acalma

Qual o surgir da estrela sobre os mares;


Quando sorris, criança, és minha calma,

Se extingue, então, a vida de pesares,

O olhar me arde e me transborda a alma!



Tradução: Luciano Maia

 

segunda-feira, 11 de março de 2024

Mandrião Estouvado

 



 Rodolfo Pamplona Filho


Eu sempre acreditei

que o trabalho emancipa

Eu sempre defendi

a importância da gentileza

Eu sempre pensei

que eu fosse visivelmente delicado

Eu sempre lutei

para prestar um serviço com cuidado

Eu sempre busquei

ser visto como alguém dedicado

Eu sempre achei

que todos me achavam bem educado

Mas, lá no fundo,

Eu não passo de um mandrião estouvado.

 

Salvador, 26 de fevereiro de 2024.

domingo, 10 de março de 2024

A lenda da Tília

 







Mihai Eminescu


-“Branca, sabes que de amor

sem lei nasceste, mas isto

fez-me jurar desde então

que esposarás Jesus Cristo!


Vestindo o hábito de monja,

Indo a um mundo mais sublime,

Redimirás tua mãe,

Me libertarás de um crime.”


-“Deste mundo, caro pai,

quem quiser dele se mude;

a minh’alma é tão alegre,

radiosa a juventude!


A dança, a música, o bosque,

Isto é o que minh’alma preza;

Não um catre solitário

Onde chorando se reza!”




-“Sei o que melhor te serve,

como eu disse assim será;

À viagem de amanhã,

Te prepara desde já!”


Mãos aos olhos leva Branca,

Tudo em sua mente se aduna;

A cabeça ardendo, louca...

Só lhe resta esta fortuna?


Seu cavalo branco, amigo,

Selado lá fora, espera;

Ela põe o pé no estribo,

Ir ao bosque delibera.


A noite vem do arvoredo

Cujo perfume a embevece;

O céu as estrelas mostra,

Doce anúncio se oferece.




Ela nos bosques penetra

Até a velha tília, onde,

Com flores que vêm ao solo,

Fonte mágica se esconde.


Embalada à voz das águas,

Canta a trompa, um som incerto.

Forte... cada vez mais forte...

Perto... cada vez mais perto...


E a fonte, presa em magia,

Brotando, um rumor espraia –

Sobre os bosques das colinas,

Lua branda de atalaia.


Como em sonho, Ela delira

E ao olhar, pasma, ao seu lado,

Vê um garboso mancebo

Em corcel negro montado...


Será que os olhos lhe mentem?

Ou será verdade pura?

Flores de tília ao cabelo,

Trompa de prata à cintura.


Ela então os olhos baixa,

Passa a mão na fronte e um gozo

O seu coração lhe inunda

De um encanto doloroso.


Ele se chega mais perto,

Infantil e suplicante;

Dela a alma se inebria,

Cerra os olhos, neste instante.


Com uma mão tenta afastá-lo,

Mas sente presos seus braços

De uma dor, de uma doçura

No seu peito em fortes laços.


Gritaria... mas não ousa,

Sua fronte cai-lhe ao ombro;

Seus beijos sem conta a boca

Dele sorve, em desassombro.



Carinhoso, ele a interroga

Mas ela a face lhe esconde.

E com voz doce, baixinho,

Pouco a pouco lhe responde.

..................................................

Vão juntos, em cavalgada,

A ninguém ouvidos dando,

E no amor, vão um ao outro

Nos olhos se devorando.


E sempre vão mais além

Por sombras, de vale em vale;

E a melancólica trompa

Soa doce, soa grave.


O seu brando som se espalha

Pelos vales ressoante,

Mais suave... mais suave...

Mais distante... mais distante...


Sobre os pinhos das colinas

Segue a lua de atalaia.

E a fonte, presa em magia,

Brotando, um rumor espraia.


 


Tradução: Luciano Maia