sábado, 4 de setembro de 2010

Gratidão

Gratidão
Rodolfo Pamplona Filho

Gratidão não se exige,
não se pede, nem se espera...
É presente de um coração puro,
que não vê outra forma de agir,
na memória da marca do passado
e do alívio do auxílio no desespero...

Por isso, a ingratidão machuca
como punhaladas nas costas,
como um tapa no rosto,
como uma dor fatal no peito...

O ingrato merece mais do que repúdio:
é pena de morte no coração,
que se fecha em uma ferida purulenta,
cujos bálsamos somente são
o ostracismo ou a ressurreição do perdão...

Reconhecer-se grato é o exercício da verdadeira humildade,
que é saber que, sozinho, não se consegue nada,
pois conquistas isoladas são vitórias de Pirro,
em que obter o resultado não significa necessariamente desfrutá-lo...

Gratidão é a resposta sincera
que o afeto exige por coerência!
É a marca que renova a esperança,
que não é a última que morre, posto imortal,
mas, sim, a certeza de que
ainda se pode ter fé na humanidade

Maceió, 03 de setembro de 2010

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

A Perda da Inocência II

A Perda da Inocência II
Rodolfo Pamplona Filho

Hoje, eu matei uma criança...
atirei, à queima-roupa, sem dó, nem piedade
no seu corpo de inocência, uma bala de realidade
no seu coração de pureza, uma facada da verdade

Dos seus sonhos, fiz escárnio
Dos seus planos, fiz ridículo
E rasguei sua esperança como papel de embrulho

Arranquei os seus olhos
Cortei sua garganta
E calei sua voz como uma vela que se apaga

Uma mente violentada
Um desejo reprimido
Um brinquedo destruído,
essa criança não existe?

Não é fênix, pois não renasce das cinzas
Não é Deus, pois não acreditam nela
Não é Mito, pois, de algum modo existiu.

Essa criança...
Essa criança...
Essa criança sou eu!

(20.01.92)

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

O Dia mais Feliz da Minha Vida

O Dia mais Feliz da Minha Vida
Rodolfo Pamplona Filho

O dia mais feliz da minha vida
foi o dia em que comecei a viver,
pois nada valia realmente a pena
Antes de você aparecer

No dia mais feliz da minha vida,
recebi você em meus braços!
Nunca tinha visto alguém tão perfeito:
um anjo para guiar meus passos...

No dia mais feliz da minha vida,
chorei tanto até soluçar,
a ponto de sua mãe reclamar
que minha lágrimas iriam você molhar...

No dia mais feliz da minha vida,
eu aprendi finalmente o que é o amor,
pois ninguém sabe o que é amar,
antes de ver da descendência o valor.

O dia mais feliz da minha vida
foi o dia mais importante da minha vida!
O Dia mais Feliz da Minha Vida
Foi o dia em que vc nasceu, minha filha!

Salvador, 20 de junho de 2010,
lembrando 13 de dezembro de 2000
e a dor de 21 de junho de 2009.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Fantasia Fugaz

Fantasia Fugaz

Vôos e Cascatas
Alegrias e decepções
Pássaros ariscos
Raízes de ilusões
Homem e natureza
Insofismável relação
Paralelas que se encontram
No infinito da razão

Crepúsculo, céu em chamas
São doces sonhos, fantasias
As mudanças de lágrimas para risos
Têm a complexidade de da noite para o dia
... da noite para o dia

Vida, margens duma porção,
Um todo preenchendo metade,
O ciclo da dualidade!
Natural e urbano
Distinguem-se na feição,
Mas são frágeis correntes entrelaçadas
numa mesma...
... canção!

Letra: Rodolfo Pamplona Filho
Música: Jorge Pigeard
(1989)

terça-feira, 31 de agosto de 2010

Morrer é Doce!

Morrer é Doce!
Rodolfo Pamplona Filho

Quando em meu peito, romper-se a corrente
Que a alma me prende à dor de viver
Não quero por mim, nem uma lágrima,
Nem um suspiro, nem um sofrer...
Não quero que uma nota de alegria
Se cale por meu passamento.
Não quero que um sorriso
Se apague pelo fim do meu triste tormento!

Viver foi peregrinar no deserto,
Procurando achar o que não estava escondido,
viver foi submergir no tédio,
Tentando encontrar o que já estava perdido
Quando se esgotar o meu suspiro,
Não desfolhe por mim sequer uma flor!
Não tornai outro ente matéria inútil.
Sozinho, da morte, deixai-me o torpor!

No meu epitáfio, escrevas:
Foi homem e, pela vida, passou
Como nas horas de um pesadelo
Que só, com a bela senhora, acordou

Descansem meu leito solitário
À sombra de um triste cipreste,
Numa floresta há muito esquecida
Onde não usurpem o que ainda me reste.
Este parece ser meu desejo final
Neste esperado momento de verdade nua.
Eis-me pronto para beijar a bela senhora
E ver como a morte é doce e crua!
(1989)

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

A Banalização da Morte

A Banalização da Morte
Rodolfo Pamplona Filho

A TV divulga, a rádio anuncia,
o jornal comunica
o saldo das mortes do final de semana...
o trânsito, o acidente doméstico
ou a costumeira e pontual queima de arquivo...

Normal...

Ouvimos impassíveis,
tomando o café nosso de cada dia,
no meio das notícias políticas
ou da alegria ou tristeza com
o resultado do jogo do nosso time...

Normal...

Não há espaço para indignação,
nem mesmo há tempo para isso...
A informação passa por
nossos olhos e ouvidos
como uma brisa imperceptível...

Normal...

O sangue escorre das imagens,
do som e dos papéis...
mas não se sente nada...
Anestesia coletiva, difusa e impessoal...
A apatia e a indiferença
não fazem acepção de pessoas...

Normal...
Normal?

Salvador, 16 de agosto de 2010, uma segunda-feira sangrenta...

domingo, 29 de agosto de 2010

O Fim do Amor

O Fim do Amor
Rodolfo Pamplona Filho

Qual é o fim do amor?
O que move alguém a achar
que não pode viver sem amar?

Qual é o fim do amor?
Por que algo tão maravilhoso
pode ser tão doloroso?

O que alimenta o amor?
As promessas? A parceria?
Os sonhos? Ou a hipocrisia?

O que alimenta o amor?
O respeito? A tolerância?
Os filhos? A esperança?

O que mantém vivo o amor?
O desejo? A vontade?
O medo? A necessidade?

O que mantém vivo o amor?
A fidelidade? O carinho dado?
A cumplicidade? Ou o papel assinado?

Qual é o fim do amor?
O casamento? A monotonia?
O divórcio? Ou a ironia?

Qual é o fim do amor?
Eu não sei...
pois o fim do amor é amar...

Salvador, 12 de abril de 2010
Postado por Rodolfo Pamplona Filho às 20:39

O Remédio Amargo

O Remédio Amargo
Rodolfo Pamplona Filho

Pode chegar um momento em suas vidas
Em que a Paixão se torna amizade,
para depois virar educação;
em que Tom Jobim e Vinícius de Moraes viram Kid Abelha,
em que o “Eu sei que vou te amar”
vira “o nosso amor se transformou em bom dia”;
em que a sua identidade de amante
é convertida em ser pai ou mãe de alguém...

Pode chegar um momento em suas vidas
em que o sexo se torna burocrático,
como um ponto a ser batido
ou um dever a ser agendado;
em que qualquer coisa é motivo para dizer não,
como se precisasse de algo para dizer não...
ou quando o “não quero”, “não pode”, “não faço”, “não vou”
se tornam mais comuns do que o “eu te amo”...

Pode chegar um momento em suas vidas,
em que não há mais gota d’água a esperar,
pois o cálice já transbordou há muito;
em que o silêncio é menos constrangedor
do que ouvir a voz do ente antes amado,
em que a ansiedade de conhecer o outro
é substituída pelo marasmo absurdo
da convivência com falta de assunto...

Pode chegar um momento em suas vidas
em que o resgate dos sentimentos de outrora
é visto como uma chatice ou perda de tempo;
em que as lembranças de momentos felizes
são vistas como um “mico” de um passado distante
em que a tentativa de diálogo é interrompida
por um bocejo ou por um olhar no infinito;
em que se percebe que o desrespeito tem perdão,
mas a monotonia não tem solução...

Pode chegar um momento em suas vidas,
em que se discute compatibilização de horários,
como se o que se tornou um já tivesse desvirado;
em que o trabalho dá prazer e o prazer dá trabalho,
onde o stress é preferível à companhia do outro;
em que vale pena se submeter voluntariamente
a um instrumento de tortura medieval,
em que passar a vida esperando a morte não soa assim tão mal...

Pode chegar um momento em suas vidas,
em que a promessa não consegue mais prevalecer;
em que a experiência derrota a esperança;
em que não faz mais sentido permanecer...
em que não há mais nada a fazer,
senão tomar o remédio amargo,
na agonia que o veneno feche e cicatrize a ferida,
em vez de provavelmente matar o paciente.

Rio de Janeiro, 24 de abril de 2010